Dez anos atrás o mundo viria a conhecer a primeira versão live-action do grupo de super-heróis mais antigo da Marvel Comics: "Quarteto Fantástico", de Tim Story. Isso, se não levarmos em consideração o filme de 1994, do diretor Oley Sassone, que era tão ruim que foi banido e nunca lançado.

O filme caricato e exagerado de Story, que chegou aos cinemas em julho de 2005, teve a infelicidade de entrar em cartaz um mês depois de "Batman Begins" de Christopher Nolan. Desse modo, a produção acabou não sendo tão bem recebida, uma vez que o primeiro filme da "Trilogia Cavaleiro das Trevas", cujo tom sombrio e trama realista, acabaria por se tornar um paradigma a ser seguido pelos demais filmes do gênero.

Agora, com um hype de longas baseados em quadrinhos plenamente estabelecido, temos um novo filme do "Quarteto Fantástico", que dessa vez é dirigido pelo novato Josh Trank.

Um filme de super-heróis diferente.

Trank declarou, na época da produção, que a FOX teria lhe dado carta branca para fazer o filme que ele queria realizar. Com tal independência, o segundo longa-metragem do diretor tem identidade própria e é bem diferente dos filmes de quadrinhos produzidos pela Marvel Studios, conhecida por limitar a atuação dos diretores de seus filmes, e também dos filmes do Homem-Aranha lançados pela Sony. Até mesmo os longas da franquia "X-Men", que possivelmente irão se relacionar com "Quarteto Fantástico", por pertencerem ao mesmo estúdio, pouco se parecem com esse novo trabalho de Josh Trank.

Talvez se aproxime mais dos filmes da Warner, em especial da Trilogia do Homem Morcego de Nolan.


"Quarteto Fantástico" tem um pé firmemente cravado no chão. As motivações e dilemas dos personagens são legítimas. Cada um deles tem funções específicas na história que está sendo contada e nada soa gratuito.

A trama gira, principalmente, em torno da amizade improvável de Reed Richards (Miles Teller), um nerd convicto e Ben Grimm (Jaime Bell), rapaz pouco esperto, casca grossa, mas de uma lealdade digna de nota. Reed é um gênio incompreendido e Ben seu "assistente de laboratório" e guarda-costas pessoal. Com o apoio um do outro, eles superam seus problemas de relacionamento com a família e chegam à maioridade unidos, separando-se apenas quando Reed tem sua genialidade reconhecida por um importante cientista, o Dr. Franklin Storm (Reg E. Cathey), que o admite no Edifício Baxter, um centro tecnológico de ponta.

O Baxter, e o Governo Americano, financiam um projeto no qual Reed esteve trabalhando desde os oito anos de idade: Um revolucionário teleportador de matéria. Com a ajuda de Susan, do relutante Victor Von Doom (Toby Kebbell) e do irresponsável filhinho de papai Johnny Storm (filho de Franklin e irmã adotivo de Susan), Reed conclui seu experimento. Porém, um acidente ocorrido por uma dose de irresponsabilidade juvenil e várias de whiskey, acaba por selar o destino de todos eles. Inclusive de Ben.

Um elenco de primeira.

Tanto Miles Teller e Jamie Bell, quanto Owen Judge e Evan Hannemann, que interpretam Reed e Ben, em versões adultas e mirins, respectivamente, foram muito competentes em seu mister, representando esta amizade com bastante fidelidade. Reed e Ben são, definitivamente, opostos, mas o modo como sua parceria foi apresentada é um dos pontos altos do longa-metragem.

Susan, ou Sue Storm, é interpretada pela badalada Kate Mara (Transcendence: A Revolução), e sua versão da personagem está bem próxima da que conhecemos dos quadrinhos originais, de Stan Lee e Jack Kirby. Sem o sex appel e situações constrangedoras vividas pela personagem, na pele de Jessica Alba nos filmes de Tim Story, dá pra levá-la mais à sério.

O irmão de Sue Storm, Johnny é encarnado por Michael B. Jordan, pupilo de Trank e astro em ascensão que tem a missão de substituir Chris Evans como o Tocha Humana, tarefa que concluiu com êxito, facilmente. Sem toda a afetação e forçação de barra que vimos no Johnny de Evans, Jordan nos entregou um personagem também irresponsável, porém crível. Palpável. Mas quem rouba a cena, previsivelmente, é Toby Kebbell, como Victor Von Doom.


Niilista, amargurado e com tendências caóticas, Victor Von Doom, neste filme, sintetiza todos os elementos que tornam um vilão de quadrinhos absurdo, como o Rei da Latvéria, em um vilão real. Banido e esquecido por todos, Von Doom vê, em uma oportunidade que se apresenta para ele no início do filme, uma maneira de se vingar e, ao mesmo, realizar dois de seus maiores objetivos na vida. Lógico que ele agarra a oportunidade com unhas e dentes. Ameaçador desde o primeiro momento em que aparece em cena. Kebbell vestiu seu personagem como um lobo sob sua própria pele. Ele mostra como Von Doom é perigoso e deixa isso bem claro, em cada olhar, em cada reação. Esplêndido.

No que diz respeito aos aspectos técnicos, o filme não decepciona. Os efeitos visuais e especiais são impecáveis. A direção de arte, e tudo que a envolve é bem resolvido, em especial o figurino, que espertamente aboliu os uniformes apertados dos heróis, substituindo-os por vestimentas que parecem ser úteis aos personagens. No caso do Coisa, a falta de vestimenta é um detalhe à parte.

Já a trilha sonora pecou por não trazer nenhum tema marcante e passa quase que imperceptível, sendo este um ponto negativo de um filme quase perfeito.

Com poucos atrativos para o público infantil e roteiro rebuscado, "Quarteto Fantástico" se destacará dos outros filmes de supers, e Josh Trank, que já tinha mostrado à que veio com "Poder Sem Limites" pode vir a se tornar um dos mais requisitados diretores de Hollywood no futuro.

A obra de Lee e Kirby foi adaptada da maneira como deve e merece: Madura, convincente e emocionante.



Marlo George assistiu, escreveu e viu a referência ao Deadpool no quarto do Dr. Destino.