Durante esse feriado prolongado o Poltrona POP teve a oportunidade de entrevistar Pedro Bouça, um dos nomes responsáveis pelo atual sucesso dos quadrinhos Juiz Dredd Magazine, publicada mensalmente pela Mythos Editora, em formato Magazine, em cores, papel couche no preço de R$10,90.


A revista tem um mix interessante de diversos personagens da britânica 2000AD, berço de nomes de peso dos quadrinhos mundiais, como Alan Moore e John Wagner.

Willian Vance, Artista de XIII e Pedro Bouça, que traduziu a obra para o
português, quando publicada pela Panini.
Nessa primeira parte da entrevista, Pedro Bouça fala das novidades programadas para o Bom Juiz, possibilidades de lançamentos futuros e uma comparação entre o mercado brasileiro e europeu.

Poltrona POP-Como é trabalhar com quadrinhos? Ainda mais com personagens de peso como Juiz Dredd e Slaíne?

Pedro Bouça -  Eu já traduzi quadrinhos antes. É um trabalho bem mais agradável que o meu habitual (analista de sistemas), mas não deixa de ser um trabalho. Há um certo orgulho em conseguir fazer uma publicação do Juiz Dredd, um grande o personagem que nunca tinha dado certo no Brasil, emplacar, mas não podemos repousar nos nossos méritos passados. Cada número é mais uma batalha para conquistar os leitores!

 POP-O que levou a editora a escolher trazer esse material em específico para o Brasil?

Karl Urban, o Éomer de Senhor dos Anéis, e do seriado
 da Warner Almost
Human, como o Dredd
P.B. - O filme do Dredd tinha acabado de ser anunciado e não havia NADA do personagem sendo publicado no Brasil. Achei isso absurdo e... uma oportunidade! Falei com o pessoal da Mythos, que eu já conhecia de longa data (muitos editores são amigos meus dos primórdios da Internet brasileira) e o Hélcio de Carvalho, dono da editora, gostou da ideia e topou na hora. O planejamento e preparação levou bastante tempo, então a revista saiu bem depois do filme, que nem tinha sido um grande sucesso (mas é muito bom!). Felizmente o público parece ter apreciado e a publicação tem se mantido nas bancas!


POP-Quais as previsões para materiais inéditos da 2000AD?

P.B - Bastante coisa. Vale dizer que eu mantenho como ponto de honra só publicar material inédito no Brasil na revista. Tem mais de 35 anos de 2000 AD na Inglaterra e a gente não vai republicar o pouco material que já saiu no Brasil! Obviamente para encadernados há maior flexibilidade... Posso adiantar que vai sair um especial com uma série INTEIRA da 2000 AD criada por Mark Millar e Chris Weston, Canon Law. É o material não-Dredd mais significativo do Millar no Reino Unido. Também vamos publicar um encadernado inédito do Dredd chamado Mandroide. Escrito, como sempre, pelo criador do personagem John Wagner e desenhado por Kev Walker e Carl Critchlow, que os leitores habituais da revista já conhecem. Pessoal de talento! Na altura da eleição, vamos lançar o especial Democracia do Dredd, com uma história bastante significativa do personagem e que se aplica perfeitamente ao momento que o Brasil está vivendo. Essa eu espero que chame bastante atenção! Esse é um dos méritos de se trabalhar com o material inglês. Quando foi a última vez que Marvel e DC falaram de eleições? Lembro do Frank Miller no Demolidor, mas há anos que o material americano tem fugido de temas polêmicos...


POP- Muitos títulos interessantes com certeza. Os quadrinhos ingleses realmente são mais contundentes que os comics americanos. O público costuma reagir melhor as edições fechadas, como encadernados ou livros, ou as séries continuas?

P.B - Difícil dizer, até porque não tenho acesso aos números de vendas. Uma série contínua ajuda a fidelizar o leitor, mas os especiais individuais podem vender mais no sentido de que o leitor pode se sentir motivado a comprar AQUELE material em especial por ser de um autor ou personagem de que gosta.

POP-A revista Juiz Dredd Magazine tem publicado histórias clássicas e modernas ao mesmo tempo. Isso não confundiria a cronologia do Juiz Dredd, por exemplo?

P.B. - Procuramos identificar com cuidado quais histórias são clássicas e quais são modernas. Atualmente todas as histórias têm sido identificadas e datadas. E também, convenhamos, o Dredd não tem uma cronologia tão rigorosa assim. Eu diria que 70% das histórias podem ser publicadas a qualquer momento. Temos usado isso a nosso favor. A publicação de clássicos tem sido feita precisamente para situar detalhes importantes da história do personagem que se refletem no material moderno. São 35 anos de material. Não daria para publicar na ordem, até porque o material mais antigo é bastante datado. Mas a gente tem tido cuidado de selecionar material que não seja tem grande necessidade de cronologia e de situar bem o pouco material que tem!

Juiz Dredd Magazine #1 - A revista já vale a
pena desde a edição de estreia!
POP-A Mythos já publicou alguns crossovers do Juiz com outros personagens, essas edições serão relançadas?

P.B. -  Os crossovers com personagens da DC a gente não pode publicar porque tudo da DC está nas mãos da Panini. Poderíamos pensar nos cinematográficos (Aliens e Predador), mas não há planos no momento.

POP - Além de "A balada de Halo Jones" existe alguma possibilidade de republicação aqui no Brasil de outros materiais da 2000AD que já foram lançados aqui, como por exemplo "Zenith", de Grant Morrinson?

P.B. - Sim, mas aos poucos. A Rebellion está prestes a republicar o Zenith lá fora, o que já ajuda a publicar uma nova edição brasileira!

POP- Qual é a sua visão profissional do mercado de quadrinhos brasileiro?

P.B. - O mercado brasileiro está em rápida expansão, mas ainda é prejudicado por diversos fatores. O mais grave, a meu ver, é a mentalidade "italiana" de todos os envolvidos. Eu explico. Na Itália, na contramão dos outros grandes mercados de quadrinhos, a banca ainda concentra 90% dos lançamentos e há uma política de fazer edições baratas e ordinárias para manter os custos baixos a qualquer preço. Até porque o público se recusa a pagar caro por um "gibi". Se os leitores não valorizam a qualidade do material, como esperam que ele seja respeitado? Isso tem mantido o material europeu, como a 2000 AD, que foi FEITO para ser publicado em formato maior e papel decente (e tem direitos mais caros, porque os artistas ou são donos do material ou recebem royalties decentes por ele), longe do público brasileiro. Estamos tentando reverter isso, mas é um trabalho para muitos anos.

POP - E quais seriam as diferenças entre o mercado brasileiro e o português de banda Desenhada?

P.B.  - A principal diferença é que o brasileiro está prosperando, enquanto o português está meio morto. Mas ainda assim, há dez vezes mais material europeu sendo publicado em Portugal do que no Brasil! Curioso ver como um mercado moribundo como o lusitano pode lançar um Lucky Luke ou Spirou (HQs franco-belgas tradicionais) e no Brasil NENHUM editor está a fim de publicar!

POP -  Me recordo de ter visto há algum tempo atrás uma coleção em BD que era publicada em um jornal se não me engano. Isso populariza os quadrinhos. Não seria uma boa hora para as editoras pensarem em algo assim, uma vez que cresce o número de filmes baseados em histórias em quadrinhos, não só de super heróis?

P.B. - As editoras já pensaram nisso há MUITO tempo! Entendo que a Panini, que foi a pioneira na publicação dessas coleções de jornal na Europa, ofereceu a mesma a todos os jornais de grande porte do país. Todos eles recusaram. Aí fica complicado, né? A Salvat agora está publicando coleções sem jornal. Temos isso na Europa também. Eu mesmo estou comprando uma de 70 (!) volumes de quadrinhos de Star Wars aqui em Portugal! Os resultados parecem ser bons. Talvez com isso os donos dos jornais, que vêm suas vendas cair vertiginosamente graças à Internet, criem vergonha na cara e decidam fazer uma coleção de quadrinhos. É só quererem. A Panini tem uma pronta! Mesmo a Mythos pode fazer fácil uma do Tex ou do Dredd. É só os jornais quererem, mas não temos como obrigá-los a isso...

POP-Depois do próprio Juiz Dredd, que teve dois filmes produzidos, o segundo personagem mais conhecido aqui no Brasil da 2000AD é o bárbaro Slaíne. O público pode esperar alguma coisa especial sobre este personagem também?

P.B. - O Sláine a gente decidiu publicar desde o começo, o que causou um certo estranhamento inicial dos leitores, que possivelmente esperavam um Simon Bisley e encontraram uma série em P&B com arte algo primitiva. Mas esse material é de qualidade e tem ganhado os leitores aos poucos. Mais um ou dois anos, quando os leitores terão a chance de ver o trabalho de artistas como Glenn Fabry (no seu primeiro trabalho regular em quadrinhos), e eu estou certo de que o celta estará rivalizando com Dredd em popularidade e terá chance de ter os seus próprios especiais e similares. Até lá, continua como parte da revista. Também há planos de quando for o momento de publicar a história O Deus Guerreiro, que já saiu no Brasil, a gente lançar direto em encadernado. Mas ainda é cedo para pensar nisso.

POP-Sei que ainda é cedo para isso, mas existe algum pensamento para o mercado expandido da franquia do Juiz Dredd? Há alguns anos foi lançado um jogo de miniaturas com regras gratuitas e existe muito material como camisetas e outros itens. A Mythos pensa em algo assim para algum de seus personagens? Conan, Hellboy ou o próprio Juiz?

P.B. - A Mythos trabalha só com quadrinhos. Da mesma forma que ela não publica merchandising, digamos, do Tex, eu penso que não o fará com o Dredd. Mas aí são decisões que estão bem além da minha alçada...

POP - Pedro, tem mais alguma coisa que você queira falar sobre a revista? Algo que seja postado como jabá?

P.B. - Enfim, gostaria que o pessoal que ainda não compra a revista desse uma chance para ela. É aquela revista grande e esquisita que os jornaleiros botam junto das de games! É cara mas vale a pena! Os maiores nomes dos quadrinhos ingleses (e uns caras que vocês não conhecem porque eram bons demais para o pessoal de lá deixar que eles fossem para os EUA...) todos os meses nas bancas!