Gibi é um negócio que se reinventa a cada segundo para não perder seu público cativo e tentar conquistar novos adeptos... Atualmente, as versões digitais dos quadrinhos reacendeu o interesse a essa mídia, dando um pouco mais de fôlego ao já desgastado formato impresso.
Mas a verdade é que a grave crise de criatividade na indústria mundial do entretenimento acaba possibilitando arroubos criativos que se diferenciam do popular e investem em temas esquecidos ou desacreditados como vampiros e afins.
Hoje, o roteirista Scott Snyder é famoso por ter escrito a saga "A Corte das Corujas" no título do Batman, não deixando a peteca cair após a vitoriosa fase escrita por Grant Morrison. Mas seu título autoral Vampiro Americano - cocriado ao lado do romancista best seller Stephen King - trouxe um frescor à já combalida indústria, inovando ao colocar vampiros no Velho Oeste e mostrando sua evolução através dos séculos.
Contando com a incrível arte do brasileiro Rafael Albuquerque, o título ganhou encadernados e spin-offs, mostrando histórias paralelas, expandindo a mitologia deste "universo" e respondendo questões em aberto durante o título mensal.
Esta antologia é muito benvinda neste sentido pois serve tanto de porta de entrada para quem quer ter uma ideia de onde está se metendo como para o leitor veterano, que recebe easter eggs como se estivesse assistindo extras num DVD.
E o time reunido para realizar a façanha não decepciona em momento algum, seguindo uma unidade tamanha, a ponto de pensarmos que todas as histórias foram escritas pela mesma pessoa...
A história de abertura - "The Man Comes Around", escrita por Snyder e arte de Albuquerque - já começa com tudo, mostrando que não é fácil pegar o vilão Skinner Sweet. Foi propositalmente dividida em duas partes, justamente para servir de prólogo e epílogo, como se fosse uma espécie de bênção aos outros colaboradores da edição.
Em seguida, temos "A Colônia Perdida", escrita pelo grande Jason Aaron (de Justiceiro - O Rei do Crime) e arte de Declan Shalvey, onde vemos uma aldeia indígena enfrentando a ameaça vampírica. Curioso como é mostrado a origem da estaca de madeira para matar os temidos "sanguessugas". Texto esperto e arte competente.
Depois é a vez de "Kansas Sangrento", com roteiro do brasileiro Rafael Albuquerque e arte de Ivo Millazzo (mundialmente conhecido pelo western Ken Parker), onde sabemos como Marie, a mãe da protagonista da saga, sobreviveu durante um levante das malditas criaturas no Velho Oeste. Apesar do texto ter agradado e cumprido sua função de entreter, a arte quase rascunhada de Millazzo dá a péssima impressão de ter sido feita com muita pressa e como um favor.
Mas nem só de Velho Oeste vive esta saga e é isso que o roteirista Jeff Lemire (de Sweet Tooth) e o desenhista Ray Fawkes mostram em "Vampiro Canadense", onde vemos como o pessoal que mora nas geladas planícies se viravam para enfrentar esses seres noturnos. O texto funciona e a arte é bem vanguardista, com um toque de fumetti...
"Ouro e Maldição", escrito e ilustrado por Becky Cloonan, mostra como Skinner Sweet acaba virando ator de cinema numa das primeiras produções no início do seculo. Uma ideia já explorada num obscuro filme mas que funcionou plenamente aqui. Destaque para as cores de Jordie Bellaire.
O grande problema de "Os Produtores" é justamente vir em seguida e contar uma história muito parecida. Apesar da arte de Francesco Francavilla ser estupenda, com muito uso de chiaroscuro, totalmente adequado neste tipo de trama, o roteiro praticamente repete as intenções de "Ouro e Maldição", porém protagonizado por outro personagem. Pena...
Já "Essência da Vida", magistralmente escrito por Gail Simone (de Aves de Rapina, Batgirl, dentre outros) e feérica arte de Tula Lotay mostra uma criativa narrativa seguindo ainda os bastidores cinematográficos, porém sob a óptica feminina de uma moca ingênua de Chicago, aspirante a atriz, que acaba caindo num "teste do sofá"... com um vampiro! Mesmo assim, ela não desistiu de ser uma estrela e planeja uma vingança só comparada a "O Conde de Monte Cristo". A arte de Lotay impressiona justamente por ser delicada e impactante, seguindo o fluxo do brilhante texto de Simone, mostrando equilíbrio e parcimônia, resultando num espetáculo à parte. De longe, é a melhor história da edição e sobreviverá por muito tempo na mente dos leitores...
"Noite Passada", escrito e desenhado pelos brasileiros Gabriel Bá e Fabio Moon, mostra como os vampiros se infiltraram nos bastidores da música, mais precisamente durante a era de ouro do jazz. O roteiro funciona, apesar da obviedade. A arte complementa o roteiro satisfatoriamente, mesmo não tendo grandes ousadias.
"Portland, 1940", com roteiro de Greg Rucka (de Batman, Renegados, dentre outros) e arte fenomenal de John Paul Leon (de Terra X), decepciona por contar uma história clichê até o osso que também remete a "Ouro e Maldição". A impressão que temos é que o editor Mark Doyle ficou numa "sinuca de bico" ao receber essa história sobre um cara que se finge de bêbado e acaba sendo enganado por espertalhões que querem roubá-lo. Só que ele morre. Mas os assaltantes descobrem, da pior forma, que ele é um vampiro. Talvez para preencher lacunas, Doyle preferiu manter essa história por contar com a elegante arte de John Paul Leon.
A edição encerra com a segunda parte de "The Man Comes Around", onde temos a promessa de que as coisas vão esquentar ainda mais pro lado de Skinner Sweet, o vampiro que todos amam odiar. Só temos de aguardar pela segunda edição desta antologia. Lamentavelmente, eu diria. Pois o mercado de quadrinhos necessita urgentemente de boas iniciativas como essa... E de preço acessível!
Kal J. Moon não entra em casa de estranhos sem ser convidado. Questão de educação, sabe como é...
Kal J. Moon não entra em casa de estranhos sem ser convidado. Questão de educação, sabe como é...

Título: Antologia Vampiro Americano Volume 1
Autor (es): diversos