Poucos meses antes do lançamento do último filme da trilogia "O Hobbit", o diretor Peter Jackson anunciou que o subtítulo do filme, "Lá e De Volta Outra Vez", seria substituído por "A Batalha dos Cinco Exércitos". Como fã de longa data da obra de J.R.R. Tokien, escritor dos livros que deram origem aos filmes que tornaram Jackson famoso (até então ele não passava de mais um  diretor de filmes de terror sem maiores pretensões) não gostei muito da novidade. Porém, ao assistir o filme, entendi o motivo que levou o neo-zelandês a tomar essa decisão: "O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos" é basicamente um filme de guerra.

O filme começa exatamente no mesmo ponto em que terminou "A Desolação de Smaug", segundo filme da trilogia. As cenas do ataque eminente do Dragão à Cidade Lago é, tal qual a alcunha do maligno verme voador, magnífica. As sequências que mostram o vôo de Smaug são vertiginosas e o modo como o monstro (e todas as criaturas do filme) foi retratado é realista ao extremo. Esta introdução do filme (que tem um desfecho arrebatador) se resolve em poucos minutos de maneira primorosa, antes mesmo de o subtítulo do filme ser apresentado na tela, dando o tom do que virá à seguir. O filme é dinâmico.


Interessante observar que mesmo entre as várias batalhas que estão acontecendo, Jackson e as roteiristas, Fran Walsh e Phillipa Boyens (a mesma equipe da trilogia "O Senhor dos Anéis") vão calmamente costurando cada ponta solta da narrativa, fechando a própria trilogia "O Hobbit", sem deixar de criar as ligações necessárias com a Saga do Anel. Impecável.

Porém, apesar das cenas de luta de tirar o fôlego e da competência técnica, "O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos", não é um filme perfeito. Longe disso.

Um dos pecados do roteiro deste novo longa é o mesmo que foi cometido em todos os outros filmes baseados na obra de Tolkien: O abuso de licença poética sob a desculpa da inadaptabilidade do cânone tolkieniano para o cinema.

Galadriel teve a sua essência usurpada em "A Batalha dos Cinco Exércitos". A personagem de Cate Blanchett sempre foi, nos filmes, bem diferente da que conhecemos nos livros, mas desta vez, exageraram na tinta ao transformá-la em uma espécie de super-elfa descontrolada e terrível. Alfrid (Ryan Gage) personagem criado para o filme falha ao ocupar o posto de alívio cômico e é protagonista das cenas mais constrangedoras de "O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos".

Enquanto o "troca-peles" Beorn é pouco explorado, Legolas está tão superestimado que comete a maior galhofa de sua carreira. Se você achava que aquela cena do "skate" de "As Duas Torres" já era exagerada demais, prepare-se para ver o que o louro élfico faz dessa vez.

Porém o que mais me incomodou foi ver que novamente Bilbo Bolseiro, personagem que dá título ao filme, não passa de um mero coadjuvante, assim como aconteceu em "A Desolação de Smaug". Quase não se vê Martin Freeman em cena, apenas em momentos chave da trama. Os próprios anões da comitiva de Thorin pouco fazem na guerra que se desenrola. Senti falta principalmente de Bombur, o anão gorducho que nos dois primeiros filmes roubava a cena toda vez que entrava em ação.

A trilha sonora é econômica e sem grandes temas. A canção que encerra o filme, na voz de Billy Boyd (o Pippin, de "O Senhor dos Anéis") é enfadonha e pouco lembra as épicas músicas cantadas por Enya, Emiliana Torrini e Annie Lennox para os filmes da Saga do Anel. Parece que Howard Shore não é mais o mesmo, ou "chutou o balde", como se diz. Aposto na segunda hipótese.

Entretanto, a direção de arte, baseada nos trabalhos de Alan Lee e John Howe, dois dos ilustradores mais celebrados do mundo quando o assunto é Terra-média merece pelo menos a indicação ao Oscar do ano que vem. Quem é íntimo do trabalho de Lee e Howe identifica imediatamente o toque dos mestres em cada cena. A impressão que se tem é de que os quadros destes artistas estão em movimento.

"O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos", apesar dos pesares, é um filmaço que entretêm e que encerra dignamente a nossa jornada pela Terra-média no cinema. Comparações à "O Retorno do Rei", terceiro filme da Trilogia do Anel e vencedor de 11 Oscar, são irrelevantes. O livro "O Hobbit" é uma obra bem menos ambiciosa que o clássico "O Senhor dos Anéis", portanto, exigir o mesmo impacto seria uma irresponsabilidade.



Marlo George assistiu, escreveu e também se acha uma pessoa pequena neste mundo tão grande. Ainda bem...