Uma das injustiças cometidas no Oscar do ano passado foi a ausência de "Até o Fim" e Robert Redford entre os indicados à Melhor Filme e Ator, respectivamente. A lista com os indicados ao Oscar deste ano só sai amanhã, portanto não sabemos se "Livre" e Reese Witherspoon estarão indicadas. Porém, se pelo menos Witherspoon (que foi indicada ao Globo de Ouro, SAG e BAFTA) não estiver entre as nomeadas à categoria de Melhor Atriz, nova injustiça será cometida pelos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.

Citei "Até o Fim", pois este filme se parece, em muitos aspectos, com "Livre". Em ambos encontramos personagens que estão em busca da razão de continuar existindo após uma tragédia. Tanto o "homem no barco" de Redford, quanto a Cheryl de Witherspoon só dependem de si próprios para acertar suas contas com o que passou e seguirem em frente.

Baseado no livro de Cheryl Strayed, "Livre - A Jornada de Uma Mulher Em Busca do Recomeço", lançado em março de 2012 nos EUA e recentemente pela editora Objetiva no Brasil, "Livre" conta a história da autora, que aos 22 anos, após um período de abuso de drogas, tenta lidar com a morte de sua mãe e um recente divórcio fazendo a trilha de Pacific Crest. A estrutura da narrativa é bem clichê, já que à cada pedra no caminho, a protagonista vai relembrando um episódio de seu passado. As dificuldades enfrentadas na trilha são espelhos de sua vida pregressa.


Reese Whiterspoon está monstruosamente bem  neste filme. Ela encarnou uma personagem profunda, cheia de conflitos e dramas pessoais de modo soberbo. O turbilhão de sentimentos que dominam Strayed são meticulosamente expressos por Witherspoon através de gestos, olhares e movimentos que conectam o expectador à personagem intensamente. Uma performance muito técnica, mas não menos emocionante. Witherspoon foi uma das poucas atrizes que me emocionaram no ano passado.

Porém, sua carreira é cheia de altos e baixos. Desde "Johnny & June", que lhe deu o Oscar de Melhor Atriz em 2005, que Reese não emplaca um filme decente. Será que serão necessários mais 10 anos até que a vejamos novamente brilhando nas telonas?

Espero que não...

A veterana Laura Dern segue sua carreira como coadjuvante de luxo, interpretando a mãe de Cheryl, Bobby, aumentando sua galeria de personagens femininas fortes e determinadas. O resto do elenco não se destaca, talvez por sua irrelevância.


A direção de "Livre" ficou à cargo do canadense Jean-Marc Vallée, um dos novos queridinhos de Hollywood, que nos brindou no ano passado com o maravilhoso "Clube de Compras Dallas". Dirigiu o filme com competência, liderando a equipe de montagem que conseguiu mesclar o passado e o presente de modo funcional, tornando o filme bem dinâmico, além de ter tido êxito ao extrair o que havia de melhor da atriz principal. Pra ser sincero, acho que Vallée é um dos melhores diretores de atores da atualidade, visto seu trabalho com Matthew McConaughey e Jared Leto, ambos consagrados com o Oscar no ano passado.

Atual, motivador e inspirador, "Livre" é um filme que mostra que por pior que esteja sua situação, sempre há um caminho para se encontrar a paz de espírito. Mesmo que este seja uma trilha longa, que o conduza para dentro de si mesmo.


Marlo George assistiu, escreveu e também já percorreu caminhos tortuosos, como a feira da Uruguaiana e da 25 de Março.