Baseado na história em quadrinhos criada por Mark Millar e Dave Gibbons, novamente dirigido por Matthew Vaughn e com um elenco estelar que conta com o retorno de Taron Egerton, Colin Firth e Mark Strong - além do auxílio luxuoso de Julianne Moore, Michael Gambon, Halle Berry, Jeff Bridges, Pedro Pascal, Bruce Greenwood, Emily Watson, Channing Tatum e até o veterano cantor Elton John -, "Kingsman: O Círculo Dourado" tenta salvar 2017 da mediocridade que ronda os blockbusters apresentados até agora.

Tapa na cara!
A verdade é uma só: o filme "Kingsman: Serviço Secreto" não precisava de continuação. Era um daqueles raros exemplares da ficção de entretenimento em que o conceito se sustentava por si só e, mesmo que o espectador quisesse ver mais daquele mundo fantástico baseado nas mais diversas franquias cinematográficas e literárias sobre espionagem, tudo o que necessitava estar ali, bem, já estava ali, com começo, meio e fim dignos de um clássico imediato da cultura pop.

O mais interessante é que o primeiro filme fez uma bilheteria bem decente mas nada garantia uma continuação de forma imediata. Mas Hollywood lida com números e cifras diversas, monetização comparada e um monte de coisas que deveria estar em segundo plano mas o fato é que um filme, mesmo que sirva ao entretenimento pura e simples, trata-se de um produto. E aqui estamos com "Kingsman: O Círculo Dourado".

Na trama, nossos heróis enfrentam um novo desafio. Quando seu quartel-general é destruído e o mundo é mantido como refém por uma megalomaníaca traficante de drogas chamada Poppy (Julianne Moore), sua jornada os leva à descoberta de uma aliada organização de espionagem nos Estados Unidos chamada 'Statesman', apresentando o dia em que ambos foram fundados. Numa nova aventura que testa a força e inteligência de seus agentes até o limite, essas duas organizações secretas de elite se unem para derrotar um implacável inimigo comum, a fim de salvar o mundo.

O fato do roteiro escrito por Jane Goldman - com participação do próprio diretor - utilizar de um enorme 'retcon' (quando um fato ocorrido é recontado sob um novo ponto de vista, trazendo informações que não haviam sido reveladas até então) para explicar como Harry Hart - personagem interpretado por Colin Firth - está de volta é bem criativo, mostrando que existe vida inteligente em Hollywood quando se deixa fazer o serviço de forma correta.

Isso sem contar que essa nova história, além de divertidíssima, tem o benefício de não ser uma história de origem, o que dá muito mais liberdade para retrabalhar outras situações deixadas em aberto no primeiro filme - algumas funcionam perfeitamente enquanto outras deixam um pouco a desejar (mas isso vai de sua expectativa - a minha estava altíssima!). E tem também o fato de tocar (novamente) num assunto seríssimo numa alegoria do que poderia realmente acontecer num futuro bem próximo, colocando-se firmemente não de forma moralista mas consciente com sua audiência.

A agência secreta Statesman é uma ótima ideia mas como necessitava de muita apresentação de personagens, algumas partes da trama ficaram de lado. Tanto que a participação de Channing Tatum é breve e, pelo que parece, terá maior destaque num futuro terceiro filme. Assim como Jeff Bridges e Hally Berry...


Mesmo que a ideia vilanesca de Poppy (Julianne Moore) seja tão - ou mais - assustadora (e POSSÍVEL) que a de Samuel L. Jackson no primeiro filme, a personagem de Moore não tinha muito carisma, o que prejudicou um pouco sua interpretação, que não chega a incomodar ou atrapalhar mas sempre se espera mais de uma ganhadora do Oscar, certo?

Mas o destaque entre todas as atuações vai mesmo para Elton John. Suas participações são hilárias, num roteiro que não se limitou a fazer de seu personagem uma mera participação especial mas sim alguém que tem papel decisivo no terceiro ato com direito a várias citações a sua carreira musical para fã algum botar defeito. E TODAS as suas cenas funcionam do ponto de vista narrativo, o que, por si só, é um bônus.

Destaque também para Whiskey, personagem interpretada por Pedro Pascal, que faz um cowboy há muito esquecido, o paladino californiano, de origem espanhola, que ficou mais conhecido após a criação do Zorro - Pascal até ostenta um bigodinho como uma espécie de homenagem (e até faz sentido, uma vez que ele também se utiliza de um laço para executar suas façanhas).

A trilha sonora original da dupla Henry Jackman & Matthew Margeson (também do primeiro filme) incorpora todo o aspecto heróico e reverente dos espiões mais doidos do cinema - uma das trilhas mais assobiáveis desde... desde sempre (ainda que lembre bastante o tema de Michael Giacchino na animação "Os Incríveis").


A direção de Matthew Vaughn ainda é precisa e vai direto ao ponto. Não fica de firula tentando emular um cinema "maior e melhor". Sua questão é preservar o espírito zombeteiro que não se leva a sério em nenhum momento mas sem virar ~"o tio do pavê" (estou lembrando de "Guardiões da Galáxia Volume 2" enquanto escrevo isso). Tudo funciona a contento: piadas pontuais (e não o tempo todo), urgência narrativa - mesmo com algumas cenas que poderiam simplesmente ficar de fora -, química entre o elenco e todo o delicioso absurdo que envolve o mundo da espionagem cinematográfica.

Não, não é melhor que o primeiro filme mas não faz feio. "Kingsman: O Círculo Dourado" é feito para quem está cansado de filmes que seguem uma fórmula que pode até estar consagrada, é verdade, mas que deveriam ser melhores justamente por isso. E esse filme É melhor. Dá tapa na cara de muito blockbuster por aí, sem dó, com vontade. Existe esperança, enfim. "Kingsman" é entretenimento com respeito à inteligência do espectador. Vaughn e cia salvam o dia novamente...


Kal J. Moon ficou imaginando... Se existisse uma agência secreta no Brasil, seriam os "Republicman"?