Dirigido por Breno Silveira e estrelado por Nanda Costa (foto), Marjorie Estiano (foto) e grande elenco (mesmo!), "Entre Irmãs" mostra a saga de duas mulheres em busca da felicidade, por mais tortuoso que este caminho possa se configurar. O filme faz parte da programação oficial do Festival do Rio - de 05 a 15/10/2017 - e estreia oficialmente no circuito a partir de 12/10/2017.

Mão dupla
Classificar "Entre Irmãs" apenas como 'drama' seria bem preguiçoso. Ainda que sua raiz seja o mais pesado melodrama - que por conta de diversos recursos utilizados acaba reproduzindo, com maior variedade de viés de produção, o que é apresentado nas telenovelas brasileiras -, o termo mais apropriado seria 'epopéia', sem o menor medo de exagero. Por volta de mais de duas horas e meia de exibição, o espectador vê o curso de duas vidas se desdobrar na telona: agruras, alegrias e desespero, tudo apresentado com muita intensidade e orquestrado para chegar a sua conclusão de forma satisfatória.

Na trama, em Pernambuco, plena década de 1930, Luzia (Nanda Costa) e Emília (Marjorie Estiano) são irmãs que sobrevivem na cidadezinha de Taguaritinga do Norte, junto de sua tia Sofia (Cyria Coentro), que lhes ensinou como ser costureira. Enquanto Emília sonha em se casar e mudar para a cidade grande, Luzia se conforma com o pouco que tem enquanto lida com as dificuldades de ter um braço atrofiado, consequência por ter caído de uma árvore quando criança. A vida delas muda por completo quando o cangaceiro Carcará (Júlio Machado) cruza seu caminho, obrigando-as a costurar para o bando que lidera.

Após a separação forçada, a vida das duas irmãs seguem narrativas distintas porém com algumas incômodas semelhanças, que não é privilégio da ficção mas das voltas que a vida dá. O que parece ser sortilégio para Emília (Estiano) pode não ter esse viés para Luzia (Costa) e vice-versa. Mas suas narrativas são paralelas, como uma via de mão dupla ou ruas separadas de alguma forma. Enquanto a vida de Luzia ganha ares de "Lampião e Maria Bonita" ou "Memorial de Maria Moura", a vida de Emília, em muitos sentidos, se parece com as tragédias "rodrigueanas", porém sem o mesmo charme ou desenvoltura.

Embora o cinema de Breno Silveira seja feito para as massas - e não há nada de errado com isso -, os temas abordados pelo roteiro de Patrícia Andrade (baseado no livro "A Costureira e o Cangaceiro", de Frances de Pontes Peebles) vão além do que poderia ser apresentado numa telenovela brasileira, por mais corajosa que fosse a direção da mesma.

"Entre Irmãs" trata, sem rodeios, de Síndrome de Estocolmo, casamento por convenção, homossexualismo, lesbianismo, política e o pensamento corrente de uma sociedade conservadora do século passado que é muito parecida com a que ainda está estabelecida nos tempos atuais no Brasil. O problema é que, por conta da fartura de temas, alguns acabam tendo muito mais espaço do que deveria, resultando num prolongamento praticamente desnecessário e até cansativo em muitos momentos por não ser tão interessante quanto a história principal (e até tomando mais espaço) - por mais importância que tenha. Curiosamente, "Entre Irmãs" se parece com dois filmes em um só. Dá pra assistir cada dicotômica narrativa separadamente, que se une ao seu inevitável final, onde cada trama toma caminho distinto.

Dentre o elenco, o destaque óbvio vai mesmo para Nanda Costa, que defende sua personagem com toda garra necessária para contar esta curiosa história, entregando-se mesmo aos momentos de nudez - alguns desnecessários mas nada que estrague a experiência. Marjorie Estiano está correta, mesmo que nenhum diretor de elenco imaginasse-a como nordestina - mas seu tipo físico faz completo sentido na história. Seu desempenho é esforçado mas sua parte da trama não é tão interessante quanto o de Nanda Costa, infelizmente. Cyria Coentro, que faz a tia que cuidou das irmãs, merece elogios por sua atuação e não duvido que haverá indicações a prêmios num futuro próximo - a cena em que está doente é de partir o coração de qualquer ser humano. O resto do elenco está correto, sem maiores alardes, o que é bem decepcionante, uma vez que dá vontade de pular todas as cenas onde Nanda Costa e o cangaço não aparecem.

Os aspectos técnicos são de dar inveja a qualquer produção em cartaz. A direção de fotografia de Leonardo Resende Ferreira utiliza muitas panorâmicas e cenas aéreas (possivelmente utilizando drones para conseguir capturar com tamanha exatidão) para mostrar as longas caminhadas da tropa de cangaceiros, utilizando tons avermelhados e marrons - mas reforçando o azul do céu -, enquanto que os trechos na cidade grande possuía tons mais sóbrios, próximos da esterilidade.

A trilha sonora original composta por Gabriel Ferreira (com supervisão musical de Antonio Pinto) evoca todo momento de confusão, apreensão e tensão com o mesmo vigor que os momentos de alívio, tranquilidade e serenidade, cercado de notas em cordas, notas longas, construídas sem pressa, casando perfeitamente com a narrativa.

"Entre Irmãs" merecia um ou outro corte para reduzir sua extensão, é verdade. Mas, por outro lado, foi corajoso para contar esta história que, apesar de um tanto óbvia, merecia ser contada desse jeito, sem concessões.


Kal J. Moon queria entender como cangaceiros não ficavam assados após caminhar tanto pelo agreste. Mistério...