Escrito e dirigido por Mauro D`Addio, estrelado por Lara Boldorini e Cauã Martins, "Sobre Rodas" toca positivamente em alguns tabus da sociedade brasileira.


Sobre inocência, amizade e preconceito
A primeira sequência de "Sobre Rodas" já impressiona pelo misto de deslumbramento e imediata quebra de expectativa pois, por um breve momento, o espectador "esquece" que assiste um filme onde um dos protagonistas possa por uma condução locomotora considerada complicada - é o jeito delicado de dizer que a personagem, um dia, já foi "normal" (e o que, de fato, quer dizer "ser normal" nos dias de hoje?).

A trama é uma comportada jornada onde "nossos heróis" partem em busca de uma resposta que talvez não exista ou não seja aquela que procuram...

O filme conta a história de Lucas (Cauã Martins), de 13 anos, que volta a escola depois de um acidente que o colocou em uma cadeira de rodas. Lá, ele conhece Laís (Lara Boldorini), também com 13 anos, e juntos partem por estradas de terra interioranas, em busca do pai que a menina não conheceu.

Mesmo tratando de temas melindrosos como paraplegia infanto-juvenil e abandono parental, o roteiro - também escrito pelo diretor Mauro D`Addio, com consultoria de Marcelo Starobinas - se presta a deixar tudo mais leve e delicado, até mesmo por conta da forma como o casal de protagonistas pré-adolescentes encaram a vida que levam. Ainda assim, o roteiro não se furta de cutucar feridas ainda abertas na hipócrita sociedade em que vivemos, onde parece consenso que alguém numa cadeira de rodas pedindo ajuda esteja, necessariamente, querendo algum trocado - e na grande maioria das vezes não é nada disso e nem custaria um centavo...


Sobre o elenco, até por conta da tenta idade dos protagonistas, boa parte do texto saí um tanto "blocado" - como se o texto tivesse sido ensaiado à exaustão mas estivesse sendo declamado e não dito com naturalidade - , o que denota um problema que não foi resolvido durante o período da preparação do elenco. Incomoda um pouco mas não atrapalha o entretenimento...

Curiosamente, o que desperta a atenção é a cuidadosa direção de fotografia - comandada por Otavio Pupo -, que mescla tomadas ordinárias com cenas construídas em ângulos inusitados - algumas, possivelmente, com utilização de fones, revelando a bela paisagem da locação.

"Sobre Rodas" é um filme interessante, honesto consigo mesmo e seu público, comedido e que conta sua trama sem rodeios mas com uma leveza raramente vista na cinematografia brasileira. É uma bela estreia, sob todos os aspectos. Gosto assim.


Kal J. Moon já ficou um tempo sem andar quando e entende perfeitamente a insatisfação do protagonista...