Quarto filme da franquia dos gigantes de outrora é bom sim, é legal sim e vale à pena dar uma conferida


Nos últimos anos tenho acompanhado algumas campanhas de linchamento de certas produções do cinema e da TV. Influenciadores e anônimos passaram a criticar filmes e séries baseados no que está sendo trucidado em sites como Rotten Tomatoes e IMDb por críticos estrangeiros, numa demonstração de falta de opinião e vergonha na cara que já está se tornando preocupante. Foi assim com Batman V. Superman: A Origem da Justiça (BvS) de Zack Snyder. Assim que o filme (que é ótimo) foi lançado, o hate foi tão grande que fez com que a Warner Bros. tomasse providências que descambaram no lançamento do péssimo Liga da Justiça, aquela versão de 2017 dirigida por Joss Whedon. Lembra?

O engraçado é que, alguns meses depois, com o advento do lançamento da versão estendida de BvS, o filme se tornou bom do dia pra noite, recebendo constrangedoras críticas positivas. E isso ocorreu injustificadamente, porque as cenas novas em nada, absolutamente nada, incrementam a trama que foi exibida nos cinemas. A impressão que ficou, pelo menos pra mim, é que as pessoas, com o tempo, caíram na real e notaram que falar mal de BvS é equivalente a assumir que não entende nada de adaptações cinematográficas de quadrinhos, especialmente após figuras como Érico Borgo (ex-Omelete, Huuro) e Rodolfo Castrezana (Nerd Rabugento) terem tecido elogios ao filme. Nós aqui do Poltrona POP também aprovamos o filme na época de seu lançamento.

O oposto também ocorre. Filmes horrorosos como Vingadores: A Era de Ultron, também de Whedon e Mulher-Maravilha, de Patty Jenkins, tiveram recepção positiva e, depois de um tempo (o da ficha cair) foram reavaliados como longas que "teriam alguns problemas e nem são tão bons assim".

Tudo motivado por rankings de sites de apedrejamento virtual de produções como os acima citados.

O padrão se repete agora, com o lançamento de Godzilla Vs. Kong, da Warner, que vem recebendo severas críticas negativas na internet e que nem é tão ruim assim. Na verdade o filme é bom, especialmente se levarmos em conta a proposta do mesmo. O filme tem alguns problemas, sim, porém, o maior deles é o linchamento nas redes, vindo de gente que não entendeu o que assistiu e anda por aí, mais perdido que kaiju em tiroteio.

Aliás, falando em kaijus, vilões da franquia Círculo de Fogo (Pacific Rim, no original), se você curtiu o filme de Guillermo Del Toro, possivelmente vai gostar de Godzilla Vs. Kong.

O filme continua a saga dos dois titãs do cinema, sendo o quarto filme de uma série de filmes ruins que só se justificam, tardiamente, por montarem o cenário (ou melhor, ringue) para o atual embate colossal de Godzilla e King Kong.

A trama gira em torno de duas meninas que tinham a função de conectar o público às duas criaturas do título. O intuito disso é claro. Jia (Kaylee Hottleé) é uma menina que tem uma relação afetiva intensa com Kong, enquanto Madison Hudson (Millie Bobby Brown), que foi apresentada no filme anterior, Godzilla II: Rei dos Monstros (2019), é uma jovem que se importa com a segurança de Godzilla, tentando evitar que a Monarch, agência cripto-zoológica do mal, se aproveite do seu gigante amigo. Apesar do potencial narrativo, o aproveitamento dessas conexões entre as meninas e os monstros no roteiro foi péssimo, especialmente no que diz respeito à Madison Hudson, sendo este um dos pontos fracos do filme.

No mais, o roteiro é previsível, e nem deveria ser diferente, pois tudo o que rola em tela é exatamente o que se espera de um filme chamado Godzilla Vs. Kong. Divertido, dinâmico e nada cansativo, o novo longa do monsterverse, diferentemente dos demais, já começa mostrando os monstros ienfrentando-se em três rounds alucinantes. Tem combates no primeiro, segundo e terceiro atos, no melhor estilo Círculo de Fogo. Minha criança interior se esbaldou com o show de efeitos visuais apresentados no longa, que ficaram à cargo de John “DJ” DesJardin (Liga da Justiça de Zack Snyder).

O roteiro foi escrito por Eric Pearson (Thor: Ragnarok) e Max Borenstein (Godzilla II: Rei dos Monstros, Kong: A Ilha da Caveira), com argumento de Terry Rossio (Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar) e da dupla Michael Dougherty & Zach Shields (Godzilla II: Rei dos Monstros).

A única atriz que se destaca no elenco é Kaylee Hottleé. Estreante, a atriz mirim é uma graça e desempenha seu papel muito bem, apesar da pouca idade e nenhuma experiência. 

Cada filme mais bela, Millie Bobby Brown (acima)é uma atriz excelente, já mostrou isso em Stranger Things, mas parece não render nas produções em que se meteu desde que alcançou a notoriedade como a "Onze" da série dos Irmãos Duffer. Estava atuando no automático em Enola Holmes, da Netflix, e no filme anterior do monsterverse, Godzilla II, Rei dos Monstros.

Alexander Skarsgård (Big Little Lies) e Rebecca Hall (Christine, Professor Marston e as Mulheres-Maravilhas) são ofuscados pela fofura de Kaylee Hottleé, Brian Tyree Henry (Coringa, Homem-Aranha no Aranhaverso) é caricato demais e apresenta uma versão dos nerds mais estapafúrdia do que aquelas que vimos na franquia “A Vingança dos Nerds”, a personagem de Eiza González (Velozes & Furiosos: Hobbs & Shaw) tem tão pouco tempo de tela quanto de importância na trama e Julian Dennison (Deadpool 2) serve apenas como um alívio cômico óbvio.


Mas este filme não dependia do elenco, e sim das criaturas digitais do título, que ao lado de Hottleé, roubam todas as cenas.

O diretor de fotografia Ben Seresin (A Múmia, Guerra Mundial Z) foi fundamental na realização de cenas que tiram o fôlego de qualquer um que não esteja fazendo birra com o filme por causa de redes sociais. O longa é muito bonito, especialmente nas cenas panorâmicas que são frequentes, tendo em vista o tamanho das criaturas. O design de produção, assumido por Owen Paterson (Jumanji: Bem-vindo à Selva, Godzilla) e Thomas S. Hammock (Bruxa de Blair) é arrojado e criam uma identidade à esta sequência, que visualmente se difere bem dos demais filmes do monsterverse, o que foi complementado pela edição de Josh Schaeffer (Godzilla II: Rei dos Monstros).

A direção do filme é de Adam Wingard e eu me preocupei bastante com a escolha deste diretor, especialmente depois do desastre que ele promoveu ao realizar a versão live-action americana do anime Death Note, de 2017, com Nat Wolff e Willem DaFoe. Além disso, Wingard também dirigiu Bruxa de Blair, 2016, pretensa sequência do hypado mockumentário de 1999. O trabalho dele em Godzilla Vs. Kong é competente, mas não o redime das tragédias anteriormente apresentadas.

Assista Godzilla Vs. Kong sem as amarras dos sites de reputação de filmes e séries, das redes sociais e de demais opiniões alheias. Assista com o coração. Você vai se divertir muito.


Marlo George assistiu, escreveu e já foi atacado por monstros que vieram de baixo: Os trolls da internet