Escrito e dirigido pelo italiano Enrico Casarosa, "Luca" é aquele filme animado confortável de fim de férias que as crianças aguardam e os adultos festejam para terem sossego por pouco mais de uma hora e meia - e, desta vez, no conforto do lar, graças ao advento do streaming


Aquela improvável amizade
"Luca" é a estreia de Casarosa na direção de longa-metragens animados. Antes, ele dirigiu o belíssimo curta-metragem "La Luna" (2011) - que chegou até a concorrer ao Oscar - mas veio se preparando por mais de dez anos até que se sentiu pronto para contar sua própria história.


Na trama, situada em Portorosso, uma bela cidade litorânea e pesqueira na Riviera italiana, um jovem que vive um verão inesquecível repleto de sorvetes, massas e passeios intermináveis de um protótipo de Vespa - aquela motoneta típica dos anos 1960 mas ainda muito popular na Itália. Luca compartilha essas aventuras com Alberto, seu novo melhor amigo, mas toda a diversão é ameaçada por um segredo profundamente bem guardado: eles são monstros marinhos de outro mundo, logo abaixo da superfície da água. 


Até aí, a sinopse lembra algumas coisas que todo mundo deveria ter visto como os animes "O Serviço de Entregas de Kiki" (ou "Sussurros ao Coração"), "Ponyo" ou até mesmo o recente e superestimado "A Forma da Água"  - e a homenagem às obras de Miyazaki e ao cultuado Studio Ghibli são propositais, conforme o diretor já defendeu em recentes declarações (temos a cidade de Portorosso que é inspirada na real cidade italiana - onde o diretor passava as férias na infância, em Gênova - mas o nome lembra "Porco Rosso", outra animação de Miyazaki - Portorosso seria o sobrenome de Luca mas resolveram batizar a cidade -, além de termos um gato enxerido mas muito expressivo que também pode ser uma homenagem, ainda que indiretamente).


Mas "Luca" investe na marotice raiz e "moleque" a la "O Pequeno Nicolau", com uma turminha esperta de personagens infantis que tem lá seus próprios dilemas mas nada muito sério ou complicado. Mas todas essas obras citadas retratam, em maior ou menor grau, algo que "Luca" se apega com afinco: o preconceito e desprezo pelos ~"diferentes" - sejam monstros marinhos ou humanos, ninguém escapa de parecer ~"diferente" para um determinado grupo social. A única luta para os personagens principais é apenas serem aceitos como são - seja lá o que forem. Temos até um protótipo de "vilão" (na verdade, só um bully um pouco mais velho - uma mistura entre o Quico de "Chaves" e o Ross de "Friends") que serve apenas para personificar parte do preconceito explorado na trama.


E nesse quesito, "Luca" é uma animação que trata do tema com responsabilidade mas com leveza também. Mesmo que algumas cenas resvalem no limite entre a farsa e a denúncia, tudo é resolvido com delicadeza e até mesmo com um pensamento lógico. Nada que crianças ou adultos fiquem remoendo pesarosamente após a exibição nem que rendam quaisquer discussões a respeito. Não é essa a proposta e, provavelmente por isso, "Luca" acabe resultando num longa um tanto quanto... esquecível.


Não entenda mal: a animação tem belíssimos, vívidos e coloridos cenários retratando as ruas e vielas italianas com uma precisão estupenda - outra "herança" de "O Serviço de Entregas de Kiki", principalmente na paleta de cores escolhida -, o design dos personagens foge completamente do que se tem visto nos filmes Disney / Pixar - assemelhando-se ao visual "boneco de massinha" utilizado em "La Luna" (e lembrando levemente os personagens de "Jimmy Neutron") -, a direção de fotografia da dupla David Juan Bianchi e Kim White promove ternos momentos mas também agilidade como nunca visto numa animação (repare na cena da descida da corrida de bicicleta na colina de paralelepípedos em plena chuva e prepare-se para momentos de tensão se já caiu da "magrela" numa situação parecida), além de diversas homenagens ao cinema italiano.

E a competente trilha sonora de Dan Romer tem aquele clima de "Sessão da Tarde" européia porém seria ainda melhor pois ninguém menos que o maestro Ennio Morricone foi convidado para compor os temas musicais do filme, porém, infelizmente, faleceu durante as negociações (nos créditos finais, há um agradecimento a ele pois a trilha sonora presta diversas homenagens às suas composições). 

"Luca" é, obviamente, uma animação de menor porte, mesmo que se veja o esmero em realizá-la. É ~"okayzinha", por falta de palavra melhor. Um autêntico "feeling good movie", gostosinho de se assistir. E ainda tem uma mensagem positiva muito bem vinda em tempos difíceis - o que parece ser a real preocupação nos três recentes longas animados da casa do rato mais poderoso do mundo. Faltou aquele "tchans" para transformar "Luca" naquela animação inesquecível como "Procurando Nemo" ou mesmo "Toy Story".  Talvez não fosse essa a intenção, afinal. 


Vale a pena? Claro! O visual é incrível, impressionante e traz aquele quentinho no coração - e uma vontade irresistível de devorar uma bela macarronada ao final. Mas vá com baixa expectativa, por via das dúvidas...



Kal J. Moon ficou se perguntando se a frase "SILÊNCIO, BRUNO!" era alguma indireta ao ator, apresentador e DJ "Luquita da Galera"...

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