"Às vezes a roupa não faz o homem"
, canta George Michael na incrível e importantíssima canção Freedom 90. E ele, ao adaptar um antigo ditado popular, está coberto de razão. 

Duna, o livro, é uma das obras seminais da ficção científica. O calhamaço, escrito por Frank Herbert, pode ser colocado na mesma prateleira de obras como Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, e da Trilogia da Fundação, de Isaac Asimov.

O interessante é que, estas três obras, celebradas, ganharam recentemente adaptações dramatúrgicas terríveis. A série, baseada na obra de Huxley, nem bem estreou e já tinha sido cancelada. A que se inspirou na clássica trilogia de Asimov é tão ruim que, nem bem terminou de ser exibida, e eu já desisti de assisti-la. Enquanto o filme, alvo da crítica do dia, é um sonífero eficiente.

Concluindo, nem sempre um livro reverenciado gera uma contraparte dramática com o mesmo peso e importância. Michael tinha razão.


Duna
já tinha sido adaptado anteriormente em filme e minissérie de TV. Em 1984, David Linch nos apresentou sua versão da história com um longa-metragem que hoje soa datado, mas que tem seus méritos. Anos mais tarde, em 2000, chegou a vez de John Harrison, diretor de Contos da Cripta, dar sua visão em duas minisséries. São produções limitadas aos recursos de suas épocas, mas que divertem.

Já a nova adaptação da obra de Herbert, realizada pelo diretor Denis Villeneuve, aproveita ao máximo todos os recursos especiais e técnicas visuais arrojadas dos dias atuais e nos apresenta um filme tão belo que nos tira o fôlego. Porém, com um ritmo que nos tira a disposição. É impossível não sentir sono ao assistir as duas horas e meia de seu novo longa. 

E o problema não é a história que está sendo contada, haja vista que é a mesma que foi trazida por Linch e Harrison, já que todas tem a mesma fonte, e sim a forma como ela foi contada desta vez. Tudo é muito lento, tedioso e permeado pela insossa trilha sonora composta por Hans Zimmer, que não para de tocar durante todo o filme. Mesmo quando é dispensável, durante alguns diálogos, por exemplo, ela está lá, inebriando-nos.

Nem mesmo as cenas de ação são dinâmicas ou empolgantes. 

Porém, o que mais me impressionou neste quesito, é o fato de que não há barrigas no roteiro. A história flui e nada em tela é dispensável, mas mesmo assim, o filme é arrastado. Se há no dicionário uma palavra que define este filme, esta é "tédio".


O roteiro foi escrito por Villeneuve, Jon Spaihts e Eric Roth. A trama poderia ter explorado mais o aspecto ecológico da história de Herbert, como a exploração da especiaria pelo império e a casa Harkonnen, em detrimento do povo originário de Akkaris, os Fremen. Paralelos com o mundo real são claros, pois até hoje, em pleno século 21, a humanidade continua explorando combustíveis fósseis sem se preocupar muito com a região ou o povo de onde estes recursos se encontram. Nem mesmo com o futuro de nosso planeta essa gente se preocupa. E, veja bem, o Imperium (como é chamado o império galáctico de Duna) é formado por muitos planeta, com diversos povos diferentes. Destruir um deles, em especial, o mais tribal deles, não seria um empecilho para o regime ficcional. No nosso caso, somos um só planeta e uma só humanidade, que vem se destruindo enquanto tira proveito de produtos escassos que envenenam nossa atmosfera. Nossa casa. 

Este tipo de paralelo fez falta, especialmente em uma obra de ficção científica que, além de entreter, serve principalmente para esclarecer através de exemplos irreais. Usando do expediente do "faz de conta", os escritores de sci-fi jogam na cara da raça humana o que ela não quer ver, ouvir e se responsabilizar. Neste aspecto, Duna - Parte 1 é um desserviço.

O elenco traz grandes estrelas, mas nenhuma delas é bem aproveitada.

O protagonista é vivido pelo Timothée Chalamet, de Me Chame pelo seu Nome, filme que lhe rendeu , em 2017, uma indicação ao Oscar de Melhor Ator. Sinceramente, não acho que ele seja um ator versátil, apesar de ter muito potencial. Quase sempre entrega o mesmo personagem melancólico, introspectivo e frágil, como aqueles de Lady Bird ou Querido Menino, de 2017 e 2018, respectivamente. 

Desta vez, com Paul Atreides, Chalamet teve a oportunidade de viver um herói, este que anda preocupado com o futuro de sua casa nobiliárquica e com seu destino messiânico. Motivos suficientes para justificar seu semblante austero e reflexivo. Mas o que vemos no filme é um garoto confuso, sem rumo e abobalhado. A direção teve culpa disso. Villeneuve poderia ter exigido mais de Chalamet


Rebecca Ferguson
vive a mãe de Paul, Lady Jessica Atreides, e apresenta um bom trabalho, sendo a melhor atriz em tela. Toda a gama de emoções escondidas por traz de um véu de poder, uma vez que a personagem é uma Bene Gesserit, monja do universo de Duna que, inclusive, inspirou George Lucas na criação de seus Jedi, são mostradas com sutileza e elegância. Seu papel poderia facilmente fazê-la cair na armadilha da caricatura, o que não aconteceu.

Oscar Isaac, que tem um papel com menor tempo de tela, cumpriu seu mister e ficou muito bem em seu figurino. 

Jason Momoa, como o carismático Duncan Idaho, tenta salvar o filme do tédio com seu carisma gigantesco, mas falha miseravelmente. Nem mesmo a piada, que vazou nos trailers, funciona. Em meio à toda atmosfera enfadonha do filme, o sorriso de lado e charminho que o ator faz (em tudo que faz) destoou.

O gigante Stellan Skarsgård, como Barão Vladimir Harkonnen, trouxe um pouco de dignidade ao personagem, que fora muito judiado por Kenneth McMillan no filme de 1984. Talvez eu desgoste de seu trabalho pelo fato de desgostar de Vladimir Harkonnen. O papel é ruim.

O "goonie" Josh Brolin, que viveu Thanos no épico cinematográfico da Marvel, está de volta como o mestre marcial de Paul, Gurney Halleck. Sisudo como sempre, o ator não sai do lugar comum e entrega um personagem que passaria batido, não fosse o fato de ser interpretado por um ator de seu calibre. 

O mesmo não pode ser dito de Javier Bardem, como Stilgar. Irreconhecível, o ator de Mar Adentro e Onde os Fracos Não Tem Vez, impressiona como o líder dos Fremen.

O filme traz ainda Dave Bautista, que anda tendo atenção demais e deveria descansar um pouco a imagem e Zendaya. A atriz, que interpreta Chani, interesse romântico de Paul Atreides, não teve muito espaço para atuar e fica lá, fazendo "carão" o tempo todo, enquanto divaga sobre seu planeta e a condição de seu povo.


Apesar dos pesares, Duna - Parte 1 é visualmente lindo. O cenário proposto pela obra original já favorecia isso, mas a direção de fotografia de Greig Fraser, que trabalhou em A Hora Mais Escura (2012), Rogue One: Uma História Star Wars (2016), The Mandalorian e, logo mais, em The Batman, fez toda a diferença. Com Villeneuve, Fraser nos apresenta cenas impressionantes do deserto de Akkaris, além de planos abertos e de encher os olhos do espaço do Imperium. As cenas de batalhas são gigantescas, apesar da lentidão já apontada.

Enfim, Duna - Parte 1 demorou a chegar e não me agradou. Alguns disseram, na internet, sempre ela, que este seria O Senhor dos Anéis da nova geração. Na boa, será, no máximo, o Star Wars - Episódio 1: A Ameaça Fantasma da nova geração.

Tente não dormir ao assistir.



Marlo George assistiu, escreveu e, pra não dormir, manteve a mão direita dentro da caixinha até o filme terminar

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