Baseada num obscuro gibi francês, "Lastman" é uma animação que tem pancadaria, sexo, terror, comédia e elucubrações metafísicas como nenhuma outra ousou fazer nessa década - ou em qualquer outra.


"É o CAPETA mascando mariola..."
Raramente se tem notícia de uma série animada recente que conquiste o público sem apelar para o lado extremamente comercial, seja na parte de design de personagens ou mesmo da própria direção de arte da mesma. Em geral, animações contemporâneas conquistam mais pela história do que propriamente pelo conjunto. E o que tem de animação visualmente ~"feia" mas que faz um imenso sucesso não está, literalmente, no gibi... Que bom que não é o caso de "Lastman".

Livremente inspirada na série em quadrinhos homônima criada por Yves Bigerel e Michael Sanlaville, com arte do badalado Bastien Vivès, "Lastman" é um achado que só foi possível por conta de um financiamento coletivo, uma vez que o estúdio perdeu um dos patrocinadores no meio do projeto, faltando animar doze episódios. A comoção foi tanta que conseguiram o dobro da meta estipulada e, assim, tivemos o que pode ser chamado de verdadeira obra de arte da animação pós-moderna.


Resuminho bobo da história: Richard Aldana é um aspirante a boxeador da corrupta cidade de Paxtown quando o dono da academia onde ele treina é sequestrado e a jovem filha dele corre perigo pois está sendo perseguida por uma misteriosa seita, que deseja cooptá-la num esquema religioso com intuitos metafísicos. Enquanto tenta resolver problemas dos quais não pediu para se meter com a máfia italiana, Aldana ainda tem que lidar com a fama repentina enquanto existe um assassino arrancando corações de suas vítimas... E a filha de seu treinador pode ter algo a ver com isso.

O roteiro de Matthieu Choquet, Leonie De Rudder, Guillaume Mautalent, Jérémie Périn, Laury Rovelli e Laurent Sarfati apresenta bem cada personagem - a primeira cena de Aldana é, talvez, A ME-LHOR introdução que já possa ter sido feita para um personagem animado! - e desenvolve muito bem a construção daquele mundo muito parecido com o nosso mas que, talvez, esteja em algum lugar entre o final dos anos 1980 e meados dos anos 1990 por conta da tecnologia utilizada pelos personagens. E TUDO é desenvolvido com uma elegância tamanha, desde cada visual de personagem como figurinos e cenários impecáveis - algumas cenas podem ser "printadas" e transformadas tranquilamente em wallpapers para PCs...


Com isso, a trama vai e vem no passado de alguns personagens para tentar explicar de forma nada didática o estranho quebra-cabeças que a trama desenvolve até seu inevitável final - que é, na verdade, um novo começo, tal qual uma "sansara" (só entende quem assistiu).

A direção do também roteirista Jérémie Périn deixa claro que tem domínio de seu mister quando vemos que alguns episódios parecem não levar a lugar algum e daí... BAM! Tá lá o gancho inevitável para o próximo episódio... E o fato de que a temporada tenha 26 episódios de pouco mais de 13 minutos cada faz com que a audiência queira assistir vários de uma vez só, cativando instantaneamente por conta do carisma de cada personagem humano - demasiado humano - e também da descomunalmente adulta história que, ainda que difira em tudo do que o gibi construiu originalmente, conecta-se à trama dos quadrinhos como se fosse uma perfeita contraparte que pode ser encarada mais como uma expansão do universo do que uma adaptação literal, numa rara combinação de fantasia e plausibilidade.


(Vale ressaltar que essa é uma série animada que DEVE ser assistida com dublagem em português por conta da ÓTIMA adaptação de Murillo Maldonado Lucas e da direção inspirada de Igor Belkind, do estúdio The Kitchen LLC - que também dubla o protagonista - e manteve todos os palavrões possíveis, mas com uma localização brasileira adequada à trama)

Se você estava sentindo falta de uma série animada com porradaria insana, com direito a litros de sangue no melhor estilo gore, cenas ultra-realistas de sexo (sério, não assista perto de crianças!), fortes doses de terror e suspense sem apelar para jumpscare barato e ótimas construções de personagens, "Lastman" é tudo o que você não sabia que precisava... E aproveita que a mesma equipe já está preparando a segunda temporada e até criou uma nova campanha de financiamento coletivo para bancá-la com toda a liberdade e independência que tiveram nessa.




Kal J. Moon lutou kung-fu e, de vez em quando, escuta uns barulhos estranhos dentro de casa. Hmmm...

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