Nova série da Disney+ e Lucasfilm é encerrada deixando mais dúvidas do que respostas

Quase dez anos atrás, a animação Star Wars Rebels estreava no extinto canal pago Disney XD. A série trazia uma nova trupe de heróis que, em pouco tempo, renovou o público da franquia criada por George Lucas,  assim como conquistou o coração dos fãs mais antigos. Logo, os tripulantes da nave Ghost, Ezra, Sabine, Zeb, Hera, Chopper e Kanan tornaram-se personagens preferidos de grande parte do público, ocupando um espaço significativo no folclore daquela galáxia muito, muito distante.


Porém, além de suas personagens e histórias próprias, Star Wars Rebels aproveitou-se do legado de sua fonte primária, trazendo personagens de todas as fases anteriores de Star Wars. Deste modo, tivemos na animação a presença de personagens icônicos como Darth Vader, por exemplo.

Mas, apesar de termos o tirano pupilo de Darth Sidious, quiçá um dos vilões mais importantes do cinema, em versão animada, foram duas outras participações especiais que chamaram atenção nas temporadas finais da animação: O Almirante Trawn, protagonista dos livros da Trilogia Herdeiro do Império, do autor Timothy Zahn, e Ahsoka Tano, a adorável padawan de Anakin Skywalker, do filme e da série animada Star Wars: Clone Wars.

Agora, em 2023, nós, os fãs de todas as idades, fomos presenteados com a série live-action, ou seja, com atores de "carne e osso" de Ahsoka.

Star Wars: Ahsoka faz parte do Mandoverso, grupo de séries do qual fazem parte ainda The Mandalorian e O Livro de Boba Fett, embora seja praticamente uma espécie "quinta temporada" de Star Wars Rebels, uma vez que começa exatamente do ponto onde a história termina na série animada.

De modo eficiente, o roteiro vai nos mostrando o que o futuro reservou para parte da tripulação da Ghost após os eventos da quarta temporada de Rebels. Dispersas, separadas pelos caminhos que tomaram após sua última aventura, Ahsoka, Sabine, Chopper e Hera acabam tendo de se reunir a fim de deter um antigo inimigo,  o já citado Thrawn, e encontrar um velho conhecido, Ezra. Ambos foram parar em um canto longínquo do universo e, apesar de terem sido dados como desaparecidos, ou até mesmo mortos, nossas heroínas - e também os vilões -, tinham motivos para acreditar que tanto Thrawn, quanto Ezra estavam vivos e que poderiam ser uma ameaça - e uma esperança -, respectivamente, para a galáxia de Star Wars.

Escrito pelo showrunner e criador da série, Dave Filoni, o roteiro é bem interessante, trazendo uma trama envolvente e emocionante. Filoni é o "herdeiro criativo" do criador de Star WarsGeorge Lucas, tendo sido o responsável pela criação e co-criação da maior parte das atrações da franquia, desde 2008, quando colaborou com Lucas na história do filme Star Wars: Clone Wars, o longa-metragem em animação que nos apresentou a personagem Ahsoka Tano.


De forma arrojada, Filoni não se ateve a criar uma história rebuscada, repleta de conexões com o restante do lore de Star Wars. Um acerto, já que tais amarras poderiam dificultar a compreensão do público que não acompanhou todos os filmes, séries de TV, animações, livros e gibis da marca. De forma simples, Star Wars: Ahsoka sugere as citadas conexões, mais de forma visual do que textual, dando um aprofundamento sutil aos tropos da aventura sem deixar a trama incompreensível ou dependente de materiais adicionais.

Isso, claro, desagrada os fãs mais experimentados, especialmente aqueles que adoram criar teorias baseadas em produções anteriores, mas deixa tudo mais fluído e fácil para o espectador eventual. 

Além do próprio legado de Star Wars, Filoni também se serviu de influências da mitologia nórdica e da literatura, especialmente do gênero da alta-fantasia, com referências interessantes de obras como O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien, e O Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa, de C.S. Lewis. Vale ressaltar que o gênero, também conhecido como "high-fantasy", é uma das bases de Guerra nas Estrelas.

Todavia, a texto traz uma inconsistência. Sim, apenas uma, mas que é deveras inconveniente. A Força, elemento importante, porém pouco explorado em outras produções de Star Wars, é tratada em Ahsoka com a sua mais devida importância. Na série nós vimos, finalmente em live-action, que existem diversas formas de sentir, usar e entendê-la, algo que só havia acontecido nas animações. As Bruxas de Dathomir, conhecidas como Irmãs da Noite, a compreendem de um jeito peculiar, chamando-a de "magia", enquanto os Jedi acreditam que a Força é uma energia que flui de todos os seres vivos, unindo a galáxia como um todo, como nos ensinou Obi-Wan Kenoby no filme Star Wars: Episódio IV - Uma Nova Esperança.

Já em Star Wars: Ahsoka, após uma década de exílio, uma das personagens anuncia que usaria o poder concedido pela força em oposição ao uso de armas. Atitude que seria louvável, se nas cenas seguintes a mesma não tivesse abandonado a autodefesa, lançando mão de uma pistola que atira lasers para matar seus inimigos.

Outra decepção foi a forma como Filoni apresentou todas, repito, TODAS as personagens que ainda não tínhamos visto em suas versões live-action. Poderiam ter sido momentos épicos, pois são esperados há pelo menos uma década pelos fãs. Porém, nada poderia ser mais anticlimático do que ver algumas delas sendo corteses, assim que fazem sua primeira aparição, com gracejos corriqueiros, no melhor estilo "Oi, tudo bem sumida?".

Além disso, a decisão de adiar, por seis episódios, a introdução de Ezra e Thrawn na trama fez com que seus primeiros momentos em tela perdessem qualquer impacto.


O último episódio termina sem concluir a história, deixando não só pontas soltas, mas também muitas questões em aberto. Ainda não sabemos se tudo será fechado e concluído em uma segunda temporada, ainda não confirmada, ou no filme anunciado na última convenção Star Wars Celebration, que será dirigido por Filoni, e que promete juntar todo o Mandoverso no cinema.

Vamos ter de esperar para ver.

Rosario Dawson reprisa seu papel como a personagem título da série. Ahsoka Tano está, em sua série solo, um tanto quanto sisuda, um aspecto de sua personalidade que já havíamos notado em The Mandalorian. Os anos tornaram aquela figura jovem e espevitada das animações em uma mulher centrada, objetiva e introspectiva. Porém, a personagem tem um ponto de virada, no meio da trama, que a amadurece e permite que parte de sua natureza audaciosa aflore, o que permite que ela cumpra suas missões de modo mais eficiente e com maior senso de grupo.

Dawson é uma atriz excelente, mas teve seu protagonismo eclipsado pela presença de dois atores  coadjuvantes virtuosos e que acabaram chamando mais atenção que ela. Tratam-se do veterano Ray Stevenson, como Baylan Skoll e da novata Ivanna Sakhno, como Shin Hati. Skoll e Hati são personagens muito interessantes pelo fato de sua relação ser algo inédito na saga Star Wars. Como "dois perdidos em uma galáxia suja", Baylan e Shin não são Jedi ou Sith, são algo além de qualquer regra estabelecida, seja pelo conselho da luz, seja pela caminho das sombras. Sua presença estabelece uma expansão do universo de Star Wars sem paralelos, abrindo caminhos novos e promissores para novas produções.

Infelizmente, Ray Stevenson faleceu antes da estreia da série. É, certamente, seu melhor trabalho.

Lars Mikkelsen retorna como o Almirante Thrawn, personagem que dublou em Star Wars Rebels. Thrawn aparece pouco, mas sua participação é impressionante. Mikkelsen empresta sua figura imponente à personagem, conferindo-a a austeridade e autoridade necessária para a sua plena construção. A dobradinha com Diana Lee Inosanto, como a obstinada Morgan Elsbeth, é um dos pontos altos em termos de atuação na série.

David Tennant é outro ator que dublou animações de Star Wars e que está de volta em sua versão live-action. Tennant deu voz à Huyang, o droid veterano do Conselho Jedi, em Star Wars: Clone Wars. Novamente seu trabalho é muito bom, pois Tennant confere personalidade ao droid, que serve como alívio cômico na trama, apesar de ter protagonizado uma das lutas mais legais de todas as produções Star Wars.

A experiente piloto Hera Syndulla é vivida por Mary Elizabeth Winstead. De longe a personagem mais cativante da série, e isso se dá pelo trabalho de Winstead, que consegue passar a aura maternal e protetora de Syndulla em sua fase atual. De todas as personagens remanescentes da animação Rebels, a Hera é, certamente, a mais bem representada em sua nova versão. Nem mesmo Eman Esfandi, que mandou muito bem como Ezra Bridger, ficou tão bom quanto Winstead como a General Syndulla.

Não gostei de Sabine Wren, apesar da heroína mandaloriana ser minha preferida de Star Wars Rebels. Sua intérprete, Natasha Liu Bordizzo, não me convenceu e a personagem estava diferente demais de sua versão original.


Terminando a avaliação de elenco, não posso deixar de falar da participação especial de Hayden Christensen, como Anakin Skywalker. Para ele, retornar ao seu papel mais conhecido foi muito arriscado, mas ao invés de marcá-lo, de uma vez por todas, como um ator de um papel só, seu bom trabalho o redime como intérprete e abre possibilidades para uma melhor condução de carreira no futuro.

O trabalho de efeitos visuais é primoroso. As criaturas digitais e batalhas espaciais são muito bem feitas. A trilha sonora, composta por Kevin Kiner, um velho conhecido dos fãs de Star Wars, por seu trabalho em Clone Wars, The Bad Batch e Histórias dos Jedi, é bonita e traz temas interessantes, que, de vez em quando, fazem referência à trilha clássica de John Williams. A mixagem e o som também são bastante competentes.

Eu não posso deixar de elogiar a canção original, Igyah Kah, composta por Kiner e interpretada por Sarah Tudzin. É a música eletrônica que Sabine está escutando no primeiro episódio. Ouça a versão demo, que é melhor que a do álbum, em sua plataforma de streaming de música favorita em alto e bom som. Vale pela própria experiência.


A edição é um dos pontos altos da parte técnica da produção e foi feita por Dana E. Glauberman, Rosanne Tan e James D. Wilcox.

Star Wars: Ahsoka teve episódios dirigidos por Filoni, Steph Green, Rick Famuyiwa, Jennifer Getzinger, Geeta Vasant Patel e Peter Ramsey. Apesar do trabalho de diversos diretores, a temporada tem episódios bem parecidos em termos de condução, como se não houvesse muito espaço para  os diretores imprimirem suas assinaturas próprias. Tanto é que não há qualquer episódio que se destaque dos demais, como se o trabalho, como um todo, tivesse sido feito por uma só mão.

Ao fim e ao cabo, Star Wars: Ahsoka poderia ser uma série bem melhor do que foi, mas tudo indica que terá seu propósito melhor compreendido no futuro, quando suas pontas soltas forem costuradas em produções vindouras.



Marlo George assistiu, escreveu e confundiu um cristal kyber com uma bala Hall´s...

Em todo o site, deixamos sugestões de compra geek. Deste modo, poderemos continuar informando sobre o Universo Nerd com fontes confiáveis e mantendo nosso poder nerd maior que 8.000. Afinal, como você, nós do portal Poltrona POP já éramos nerds antes disso ser legal!