Em cerca de oito horas, a Prime Video comete aquela que pode ser a MELHOR SÉRIE BASEADA EM VIDEOGAME de todos os tempos

Eu nunca fui um ávido jogador de videogames. Quando era criança ganhei, no natal de 1983, um Odyssey, que era fabricado no Brasil pela Philips e que vinha com dois cartuchos, na promoção: O multijogos que trazia os games Fórmula 1, Interlagos e Cryptologic, além do famigerado Didi na Mina Encantada (que, na verdade era um mod brazuka de Pickaxe Pete)

Esta minha primeira (e única) incursão no mundo dos games me jogou em uma área pouco explorada: A dos donos de console que só gente rica tinha. O Odyssey era um videogame caro e só os mais abonados tinham tal aparelho. Bem, em New Iguassu City, especialmente nos anos 80, só eu e mais dois candangos tínhamos Odyssey, o que dificultava a "troca de fitas", tão comum entre os usuários de Atari e Supergame, que eram consoles mais acessíveis.

Como eu já tinha o Odyssey, meu pai concluiu que eu não precisava de um outro videogame, e que o meu próximo "presente" deveria ser um computador, um trambolho que, naqueles tempos, ninguém tinha e com o qual não dava para se divertir. 

Bem, meu pai foi assassinado em 1989 e eu só fui comprar um computador em 1996, quando já era um homem adulto de 22 anos e profissional da área de T.I. (OBS.: Na real, nós éramos chamados de técnicos em processamento de dados (e estudávamos algoritmos, antes disso se tornar, para alguns imbecis, "algo mágico"), mas a maioria da galera de hoje em dia nem sabe patavinas do que estou falando.)

Com isso, meu interesse em games foi diminuindo e hoje em dia só curto jogar Elevator Action, Rally-X, Moon Patrol, Street Fighter, Mortal Kombat e KOF (todos), jogos com os quais me divertia em fliperamas, e que revisito em emuladores.

Deste modo, não posso dizer que conheço, em detalhes, Fallout ou qualquer outro jogo eletrônico nos últimos 41 anos.


Ocorre que, não é preciso ser versado na franquia da Bethesda Game Studios, criada por Tim Cain, em 1997, para encontrar entretenimento na série da Amazon Prime Video. A única coisa que eu conheço desta série é a mascote do jogo: um simpático e jovem rapaz louro fazendo "joinha". Para além disso, nada mais sei sobre o produto. Acredito que qualquer pessoa que acompanhe a cultura POP, mesmo que de forma descompromissada, deve saber que esta ilustração bacana é referente ao jogo Fallout.

E isso, por si só, foi o suficiente para que eu me sentisse atraído pelo roteiro. O gesto da mascote, tão emblemático e POP, é explicado poucos minutos após o início do streaming e isso criou uma conexão entre mim e a série muito profunda. Esta passagem do roteiro foi a isca perfeita para me fazer seguir assistindo o programa.

Outra qualidade do texto do primeiro episódio é a apresentação das personagens. Foram-nos mostrados três núcleos distintos de personagens. 

O primeiro era o dos moradores do Vault 33, pessoas que viviam em um abrigo subterrâneo e protegido dos perigos do "mundo lá fora". Neste ponto, vale ressaltar, que Fallout traz uma trama que se passa em um Planeta Terra (leia-se, Estados Unidos) 200 anos após um ataque com bombas atômicas nos anos 50 do século XX. Neste núcleo temos contato com a inocente Lucy MacCready (Ella Purnell), uma jovem mulher que quer um pretendente. Ela é apresentada como uma moça treinada em artes marciais, com expertise em mecânica e bem disciplinada. Estas características são utilizadas ao longo da história criando muita consistência em suas ações, motivações e importância naquilo que está sendo mostrado em tela.

O núcleo que é apresentado em seguida é o da Irmandade do Aço, cujo personagem principal é o escudeiro Maximus (Aaron Moten). A Irmandade é uma espécie de organização de "templários" na qual os cavaleiros não precisam de cavalos, porque usam armaduras robustas e tecnológicas. Os líderes da Irmandade são chamados de clérigos e tudo remete a uma milícia, no estrito sentido do termo.

Já o terceiro núcleo traz personagens do passado, nos anos 50, e da linha temporal atual da série, que se passa em 2296, por estar relacionada ao personagem interpretado por Walton Goggins, Cooper Howard. Não irei me estender neste núcleo para não incorrer em spoilers, mas posso afirmar que, enquanto o primeiro núcleo tem uma inspiração óbvia na ficção científica literária dos anos 50, em especial a série dos robôs de Isaac Asimov, e a segunda nas obras mais atuais deste gênero, como o anime Macross (também conhecido como Robotech) e o RPG Balística, escrito por Jorge Caffé e Leon Santos, esta parte da trama é bastante próxima dos filmes de terror dos anos 80, como A Volta dos Mortos Vivos (1986), de Dan O'Bannon.

Tudo isso foi apresentado no primeiro episódio de Fallout, intitulado, de modo bem sacado como "O Fim". Eu curti os três núcleos, separadamente. Achei tudo bem interessante, mas não sabia como o roteiro iria conectar tudo que foi apresentado em um produto que fizesse sentido. 

Como tudo isso irá se conectar de modo coerente para justificar uma obra com produção de Jonathan Nolan e que é baseada em uma franquia de videogame com 25 anos de existência?

Conclui, mordendo a "isca", que a resposta estaria no segundo episódio. Assim sendo, cliquei para assistir o episódio 2, intitulado, novamente de modo genial: "O Alvo". Logicamente me identifiquei. Então segui acompanhando a eletrizante história contada pela equipe de roteiristas de Graham Wagner e Chaz Hawkins


Flertando, de propósito, com a estética do "sci-fi trash vintage", trazendo vislumbres de obras como Plano 9 do Espaço Sideral  (1957), de Edward D. Wood Jr., e a série de TV Story Parade, de 1964, com Peter Cushing (o Grão-Moff Tarkin de Star Wars: Episódio IV - Uma Nova Esperança), a série Fallout nos apresenta um roteiro excelente, com tudo aquilo que esperamos de um produto de entretenimento, como ação, aventura, comédia, suspense e, até mesmo terror gore, sendo um produto condizente com aquilo que se espera de uma produção popular.

Fallout também abusa nas canções originais, trazendo muitos clássicos dos anos 50, uma vez que, após um apocalipse neste período, qualquer referência posterior seria impossível, pois jamais existiu, especialmente em cenas em sequências de câmera lenta, no melhor estilo Zack Snyder.

A direção de atores foi facilitada pelo talento de estrelas como Ella Purnell, Walton Goggins, Moises Arias (que arrebentou), e Kyle MacLachlan. Acho que o único nome de grandeza do elenco que me desagradou foi Aaron Moten. O ator (que se parece muito com Jonathan Majors, o Kang do MCU) não conseguiu se conectar com a sua personagem.

Nos aspectos técnicos, não há o que se criticar. Tudo é feito com excelência. Desde os efeitos especiais e visuais, passando pelo som, trilha sonora e edição, tudo beira a perfeição. A produção se beneficia pelo fato de usar locações reais e efeitos práticos em diversas cenas que, erroneamente, poderiam ter sido feitas em CG. 

Minha única reclamação é a montagem. Os dois últimos episódios pecaram neste quesito. Os primeiros seis episódios tiveram ritmo frenético e constante, porém o sétimo e penúltimo episódio trouxe uma inesperada lentidão. Como alguém que está em um carro em alta velocidade, cujo freio de mão foi puxado inesperadamente, minha cabeça chacoalhou e tudo que absorvi nos seis primeiros episódios foi organizado repentinamente, fazendo-me conectar todas as pontas soltas da trama e isso tornou a conclusão desta primeira temporada previsível.

De todo modo, Fallout é a melhor produção televisiva produzida para consumo doméstico e que é baseada em videogames. Isso é inegável. Mesmo sem ter sido absorvido, pela vida, para o mundo dos games, estou ansioso pela segunda temporada.



Marlo George assistiu, escreveu e nunca, jamais e nem em nenhuma hipótese limparia seu orgulho na cortina

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