Indicado a duas categorias no Oscar 2025, produzido, escrito e dirigido por Jesse Eisenberg, Kieran Culkin, Jennifer Grey, Will Sharpe e Daniel Oreskes (além do próprio Eisenberg), o filme "A Verdadeira Dor" procura explorar algo intangível mas raro nos atribulados dias atuais: quem realmente somos quando estamos sozinhos?


Saudade do que a gente não viveu
"Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro (...) Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira", diz os trechos iniciais do conto "O Espelho", de Machado de Assis (1839-1908).

O que o texto estudado à exaustão por alunos que prestarão vestibular é a explicação mais básica da psicologia sobre id, ego e superego, sobre o que cada ser humano representa para seus similares, o que ele se torna por conta da convivência e o que ele realmente é, de fato, quando ninguém está olhando. A partir desse estudo de caráter, o filme "A Verdadeira Dor" traz algumas amostras do resultado do que acontece do encontro entre a culpa judaica e depressão misturada com bipolaridade.


Na trama, David e Benji são primos - completamente diferentes entre si em suas personalidades - que se juntam para uma viagem pela Polônia, a fim de visitar a casa onde nasceu sua avó, mas as coisas não saem como o que se espera do mais agradável passeio em família.

Chamar o roteiro escrito pelo próprio Jesse Eisenberg (vencedor do prêmio de roteiro do Sundance Film Festival) - que também dirige e coestrela - de "dramédia" seria pura preguiça, uma vez que a trama flerta com o "road movie" e um "coming of age" mais existencialista, lidando com assuntos pesados como depressão e até mesmo a possibilidade de atentar contra a própria vida por parte de um dos personagens. O problema é que o roteiro se perde num desnecessário palavrório que vai de nada a alhures, porém não um lugar que, como audiência, queira-se realmente estar ou assistir. É como presenciar uma discussão na casa de amigos e ficar sem jeito de pedir para ir embora dali.  


A direção de Eisenberg (que escreveu e dirigiu anteriormente o obscuro filme "Quando Você Terminar de Salvar o Mundo", em 2022) deixa alguns membros do elenco mais soltos do que outros, dando a impressão que alguns têm permissão para improvisar e outros estão acorrentados ao burocrático texto. Fosse uma peça de teatro ou um livro - e não duvide se esta tiver sido a intenção inicial do autor -, haveria espaço para uma fina ironia que nunca é devidamente captada quando o elenco está em cena.

Kieran Culkin - ganhador do prêmio Golden Globes de Melhor Ator Coadjuvante (mesmo sendo, de fato, o real protagonista) e indicado ao Oscar de Melhor Coadjuvante - faz o personagem sarcástico, irônico e irritante que ele faz na maioria dos filmes e séries que participa (assista a série "Sucession", se acha essa declaração um exagero). Mas, independente disso, tem alguma verdade em sua performance - mesmo que seu personagem nem mesmo evolua com o passar de sua jornada, sem nada realmente interessante ocorrendo com ele.


O mesmo não se pode dizer de Jesse Eisenberg, que parece impressionantemente desconfortável (e despreparado!) com a peculiar situação de coestrelar o filme e dirigi-lo ao mesmo tempo. Ainda que houvesse algum espaço para dramaticidade de seu personagem, quando acontece, parece que entra no piloto automático e faz o tipo de personagem que ele sempre fez no cinema: aquele cara meio paranoico, com tiradas depreciativas e "certinho" demais - só para parecer o exato oposto do personagem de Culkin.

O restante do elenco está meramente operante, sem maiores arroubos de performance, tendo oportunidade apenas de reagir ao que veem e aprendem durante a viagem - Jennifer Grey (sim, de "Dirty Dancing - Ritmo Quente" e "Curtindo a Vida Adoidado") que tem ascendência judia, se emocionou bastante em algumas locações como o museu em Majdanek (um centro educacional fundado em 1944 e que, anteriormente, foi um campo de concentração nazista), que teve de ser contida por Eisenberg, uma vez que ela não estava conseguindo se conter...


A direção de fotografia de Michal Dymek (do recente "A Garota da Agulha", que concorre na categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2025) é o maior atrativo, com diversas panorâmicas mostrando várias paisagens da Polônia e seus locais turísticos em ângulos inusitados, equilibrando bem em espaços internos como o quarto de hotel e até mesmo um banheiro (provavelmente gravado num horário que não permitiriam muito barulho por conta dos hóspedes vizinhos - mas que acaba sendo colocado "na conta" do excêntrico personagem interpretado por Culkin).

Não precisa ser da religião judaica para entender que o que foi feito com judeus por todos os oficiais da SS foi algo deplorável. Assim também como não precisa ser muito inteligente para perceber que a reclamação dos personagens de "A Verdadeira Dor" parece mais algo ensinado por ancestrais e que, na verdade, reside mais na palavra, sem muita importância, com alguma comédia (bem tímida e raquítica) mas facilmente esquecível - assim como esse filme. Assista e tire suas próprias conclusões.



Kal J. Moon também odeia propaganda em vídeos do YouTube ou plataformas de streaming - e concorda que todo mundo odeia isso...

Em todo o site, deixamos banners de sugestões de compra geek, mas você pode nos ajudar fazendo uma busca através destes links, e deste modo poderemos continuar informando sobre o Universo Nerd sem clickbaits, com fontes confiáveis e mantendo nosso poder nerd maior que 8.000. Afinal, como você, nós do portal Poltrona POP já éramos nerds antes disso ser legal!