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O HOBBIT : Conheça a história da obra que deu origem ao filme


Por Marlo George

Numa toca no chão vivia um hobbit.

Assim começa uma das mais despretensiosas obras jamais escrita, conforme sua tradução brasileira feita por Lenita Maria Rímoli Esteves e Almiro Piseta. O autor, que além de filólogo era professor na Universidade de Oxford, escreveu aquela pequena frase em uma folha de papel, que havia sido deixada em branco por um de seus alunos, enquanto corrigia provas em seu escritório particular. Ele a escreveu enquanto devaneava observando um furo na cortina que cobria a janela de seu escritório, por onde passava um raio de luz do sol.

O jovem J.R.R. Tolkien
J.R.R. Tolkien, o tal professor, escreveu a aludida frase meio que distraidamente e assim iniciou uma das mais importantes sagas do Era Moderna, que é contada em três obras, que formam o que Tolkien chamou de Legendarium: O Silmarillion, O Hobbit e O Senhor dos Anéis.

Logo após escrever a frase, Tolkien se pôs a imaginar o que seria aquele tal "hobbit". Sua imaginação fértil em pouco tempo o faria criar não só o "hobbit", mas também uma aventura para ele. Porém, atarefado  por seus deveres como professor, ele acabou abandonando a história sem terminá-la, deixando-a esquecida em uma gaveta de sua escrivaninha. Era o ano de 1930.

Esta é a escrivaninha onde Tolkien escreveu
 o Manuscrito de O Hobbit e onde o
"sepultou" por seis anos
Em 1936, uma das alunas de Tolkien, Elaine Griffiths, estava em sua companhia no escritório ajudando-o em uma de suas enfadonhas tarefas de Professor, quando encontrou o manuscrito de "O Hobbit" na escrivaninha. Ela pediu permissão para lê-lo e Tolkien não se importou em conceder a permissão. Griffiths ficou tão encantada com o conto inacabado de seu professor que o convenceu a terminá-la para que ela pudesse deixá-lo com Susan Dagnall, uma de suas amigas mais chegadas, que trabalhava em uma editora que poderia ter interesse em publicar o livro.

Com o manuscrito finalmente terminado, após exímia revisão, Tolkien o entregou à sua aluna que por sua vez o deixou nas mãos de Susan Dagnall para que esta o submetesse a apreciação dos editores. Ocorre que Stanley Unwin, um dos donos da editora Allen & Unwin, acreditava que os melhores juízes para livros infantis eram as próprias crianças (quem melhor para julgá-los) e incumbiu seu filho, Rayner Unwin de 10 anos, a tarefa de ler o livro e resenhá-lo.

O pequeno Rayner leu o livro e ficou fascinado, escrevendo à seu pai a seguinte resenha, em 30 de outubro de 1936:

A lendária resenha de Rayner Unwin

"Bilbo Baggins é um hobbit, que vive em uma toca de hobbit e que nunca pensou em se aventurar por aí, até que Gandalf, um mago, e seus anões o convencem a se aventurar. Ele passa então a lutar contra goblins e wargs, até que chegam à Montanha Solitária; Smaug, o dragão que a invadiu é morto e após uma terrível batalha contra os goblins, Bilbo retornou à sua casa rico. Este livro, com a ajuda de alguns mapas, não precisa ser ilustrado, e será muito apreciado por crianças com idade entre 5 e 9 anos."

Rayner Unwin
Com a aprovação de Rayner, Stanley Unwin não teve dúvidas e em 21 de setembro de 1937, bem a tempo  de ser vendido na época do natal, publicou-o. A primeira tiragem do livro foi de 1.500 cópias. O Hobbit se tornou um fenômeno de vendas e uma segunda impressão foi encomendada em 15 de dezembro daquele mesmo ano, desta vez com 2.300 cópias. Com o sucesso do livro Stanley Unwin requisitou ao professor uma sequência. Tolkien prometeu que pensaria em algo, mas ele estava por demais envolvido na produção daquilo que esperava ser sua obra-prima, O Silmarillion, e assim se passaram anos sem que Unwin recebesse uma resposta sobre a publicação daquilo que costumava chamar de "O Hobbit 2".

Ocorre que Tolkien via na publicação de uma sequência de seu primeiro livro a chance de publicar aquilo que mais o interessava, que eram as lendas dos elfos de O Silmarillion, e, deste modo, passou a inserir no livro, que a essa altura já se chamava O Senhor dos Anéis, elementos destas lendas. Nesta época, Rayner Unwin, o garotinho que resenhou O Hobbit, era agora um adulto e fora estudar em Oxford e, nada mais natural, quis conhecer o escritor em pessoa. 

Os dois se deram muito bem, e à certa altura da conversa, Unwin citou a tal "sequência" de O Hobbit. Tolkien disse que ainda não tinha terminado, mas que não ligaria se o rapaz lesse aquilo que já havia escrito. Novamente Rayner ficou encantado com aquilo que, mesmo inacabado, lera do manuscrito. Comentou com seu pai que Tolkien havia finalmente começado a trabalhar na sequência e que aquilo que estava fazendo era uma obra-prima. Stanley Unwin já não estava tão animado quanto antes em relação à uma sequência de O Hobbit, uma vez que o livro já havia sido publicado a quase 15 anos e Tolkien já havia publicado pelo menos dois outros livros de sucesso, mesmo que não equivalente a O Hobbit, chamados Leaf by Niggle (A Folha de Niggle, publicado por aqui pela Conrad na coletânea A Arvore das Estórias) e Farm Giles of Ham (publicado no Brasil com o título ridículo de Mestre Gil de Ham, pela Martins Fontes).

O velho Professor em seu escritório.
Como Tolkien vinha inserindo na sequência de O Hobbit elementos de seu Legendarium, uma revisão do livro original se fazia necessária, e assim foi publicada a segunda edição de O Hobbit em 1951 com 3.500 cópias. Tratava-se de uma edição extendida, já que o capítulo "Advinhas no Escuro" foi em grande parte ampliado e reescrito. Na primeira edição, Gollum era apenas uma criatura meio amalucada e pouco agarrada ao seu "presente de aniversário" e isso criaria um contraste muito grande com a criatura mesquinha, possessiva e homicida que ele se tornara em O Senhor dos Anéis.

A sequência de O Hobbit, O Senhor dos Anéis acabou sendo publicada em três volumes, entre 1955 e 1956, muito tempo depois do pretendido e em uma época em que os leitores da primeira edição já eram adultos. Tolkien ainda viria a trabalhar em vários outros manuscritos durante sua vida, tanto é que vez por outra seu filho, Christopher Tolkien nos surpreende com um livro novo (apesar de antigo).

O Professor morreu em 1973.

Bilbo e os anões no novo filme de Peter Jackson
Hoje, 82 anos depois de Tolkien escrever aquela frase em uma folha de papel abandonada, somos presenteados com mais uma adaptação desta sua obra (O Hobbit já foi adaptado para a TV e até foi produzida uma animação em 1977) pelas mãos da mesma equipe que não decepcionou os fãs do Professor quando adaptaram O Senhor dos Anéis, que foi lançado entre 2001 e 2003. O Hobbit - Uma Jornada Inesperada estreará em 14 de dezembro de 2012.