Keanu Reeves acertou finalmente. Após quase dez anos de escolhas erradas e papéis medíocres, o libanês cujo nome é havaiano (significa "brisa suave sobre as montanhas") se despede de personagens pobres em filmes paupérrimos, como Alex Wyler de A Casa do LagoKlaatu do remake O Dia em que a Terra Parou, para vestir o traje de Kai, um rapaz criado por demônios e "adotado" por um samurai, na nova versão cinematográfica da história dos 47 Ronins. Desde de Constantine, filme que até é execrado por fãs da obra original, não o vemos tão bem em um papel.

Kai, por ser um personagem de natureza disciplinada, não abriu espaço para que Reeves exagerasse na interpretação e foi muito legal poder ver o ator performar sem a moleta das costumeiras caras e bocas e maneirismos exagerados. O Kai entregue a nós por Reeves está muito consonante com aquilo que a personagem seria, caso existisse fora das telas dos cinemas. Um trabalho realmente primoroso de um ator que até então só se destacava em razão do tamanho das produções em que se envolvia e não, propriamente, por seu talento.

Ferroada ou sabre de luz?

Dirigido pelo estreante Carl Rinsch, o filme traz referências claras daquilo que há de melhor no cinema japonês, ou seja, Akira Kurosawa e Hayao Miyazaki. A inspiração de Rinsch no trabalho destes dois cineastas maravilhosos é evidente.

O roteiro é afiado como uma katana e condizente com aquilo que era a sociedade feudal japonesa da época em que a trama é passada. Quem conhece o período, seja pelos filmes de Kurosawa, pela série Shogum, ou até mesmo pelos mangás Vagabond ou Rurouni Kenshin não irá estranhá-lo. Na verdade, apenas duas coisas me causaram estranheza neste filme e ambas dizem respeito ao roteiro: A primeira foi o fato de o filme ser falado em inglês, o que é compreensível, pois trata-se de uma produção americana, mas certamente ficaria muito mais bonito, e correto, se fosse falado em japonês. A segunda a insistência em se referir à yokais como demônios. Um yokai não é um demônio e sim um espírito, o que é bem diferente. Porém este erro é bastante comum.

Kai defendendo sua amada Mika.
Não posso terminar esta crítica sem ressaltar a qualidade do resto do elenco. Cary-Hiroyuki Tagawa, mais conhecido como Shang Tsung de Mortal Kombat, interpretou o Shogun Tsunayoshi e está impagável no papel. Ele transmite a rigidez, a frieza e a grandeza dos ideais do Bushido (código samurai) em pessoa.

Hiroyuki Sanada, que esteve excelente como Ujio de O Último Samurai, interpreta desta vez Ôishi, um samurai que tem seu título retirado pelo próprio Shogum e se torna um Ronin (samurai sem mestre). O personagem de Sanada é um dos pilares principais da trama e poderia ser considerado o protagonista da mesma, não fosse a presença de Keanu Reeves no elenco.

Demônio o escambau, Yokai!
47 Ronins não é um filme recomendado apenas para aqueles que apreciam obras nipônicas ou que curte filmes de ação. É a adaptação de uma lenda japonesa, exagerada, mistica, exacerbada, porém bela, lírica e cheia de significados. A relação de Kai com todos os outros personagens da história pode ser fonte de observação e reflexão. Temas como rejeição, banimento, traição, ódio, preconceito, redenção, honra e amor permeiam a vida deste samurai tardio, que segue o caminho da espada segundo suas próprias convicções e vontade.

É um filme imperdível.






Avaliação: Excelente


Marlo George assistiu, escreveu e já fez um harakiri com uma faca de festa.




Data de lançamento: 31 de janeiro de 2014
Distribuição: Universal Pictures
Direção: Carl Rinsch
Roteiro: Chris Morgan, Hossein Amini
Elenco: Keanu Reeves, Hiroyuki Sanada, Ko Shibasaki, Tadanobu Asano, Min Tanaka, Jin Akanishi, Masayoshi Haneda, Hiroshi Sogabe, Takato Yonemoto, Hiroshi Yamada, Shû Nakajima, Cary-Hiroyuki Tagawa, Neil Fingleton, Rinko Kikuchi, Natsuki Kunimoto
Gênero: Ação, Aventura, Fantasia
Duração: 118 minutos

Sinopse: Um grupo de samurais decide vingar a morte de seu mestre.