Nem sempre as cinebiografias contam fielmente a vida do biografado. Sendo a fonte utilizada para basear o roteiro autorizada ou não, poucas vezes o que vemos na tela corresponde ao que aconteceu na vida real. Por isso, a maioria destas produções preocupa-se em alertar o espectador de que o filme trata-se de obra baseada em fatos reais.


"Irmã Dulce", cinebiografia que conta a história de Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes, mulher exemplar que dedicou sua vida à religiosidade e à filantropia, esbarra justamente no problema de que o roteiro não podia ser romanceado ou carregado de liberdades poéticas. A figura real é importante demais e de ilibada reputação ao ponto de que qualquer ponto fora do contexto de sua real saga, poderia comprometer fatalmente o resultado final do filme. O que poderia acontecer de pior a esta produção seria a banalização de seu propósito de documentar a vida da freira.

Deste modo, o roteiro de "Irmã Dulce" acaba contando a história de uma mulher forte, rebelde, à frente de seu tempo, mas que não tem desdobramentos emocionantes, conflitos ou outros eventos que tornam uma cinebiografia interessante. É um filme simples, sobre uma pessoa que levou a vida na simplicidade. Durante os três atos do longa, conforme a vida de Irmã Dulce vai sendo contada, nos deparamos com várias versões do mesmo enredo: A dificuldade de conseguir realizar as mudanças necessárias para que a vida das pessoas, neste caso os pobres do nordeste, seja tratada com dignidade.


Bianca Comparato e Regina Braga, que interpretam a religiosa em duas fases de sua vida, a juventude e a velhice, respectivamente, fizeram um trabalho de caracterização e interpretação cuidadoso. Braga estava irreconhecível e é responsável por alguns momentos emocionantes do longa, mas destaco Comparato pela forma como emulou a voz e o sotaque de Dulce, que ficou muito próximo do real. O resto do elenco é composto por alguns medalhões da dramaturgia nacional, como Gloria Pires, Zezé Polessa, Gracindo Júnior, Caco Monteiro (ótimo como o Prefeito de Salvador) e Fábio Lago.

"Irmã Dulce" não é uma cinebiografia empolgante, cheia de conflitos e excessos como as de astros da música popular brasileira que vimos recentemente. O que prejudicou-o como entretenimento é apenas um fato: Irmã Dulce é maior que a vida.


Marlo George assistiu, escreveu e, apesar da nota atribuída ao produto em si, passou a admirar o "Anjo Bom do Nordeste".