"Tô Ryca!" é a primeira comédia estrelada por Samantha Schmütz. Cercada de atores e comediantes realmente engraçados como Marcus Majella, Fabiana Karla e grande elenco, fica a pergunta: como Schmütz se saiu, tendo de protagonizar um longa-metragem?

Turma de "TôRyca!" reunida...

Uma comédia sem vergonha...
"Humor que funciona é aquele que nos faz rir. Do contrário, não é humor. É outra coisa...", já dizia o saudoso Chico Anysio, mestre brasileiro da comédia, quando questionado sobre o ~"tipo" de humor que fazia. É curioso analisar, por este parâmetro indicado pelo "amado mestre", se "Tô Ryca!" funciona - ou não.

Bem, comecemos pela trama escrita por Fil Braz (de "Minha Mãe é uma Peça - O Filme"). Baseado no inspirado no livro americano “Brewster’s Million”, do autor George Barr McCutcheon - que serviu como base para outros 11 longas, entre eles “Chuva de Milhões”, um clássico da comédia estrelado por Richard Pryor - , não é difícil pensar que adaptar este consagrado texto para a realidade brasileira não seja nada fácil. Mas isso apenas se a responsabilidade caísse em mãos inabilidosas.
Luane (Katiuscia Canoro) e Selminha (Samantha Schmutz):
amigas para sempre
A solução foi a seguinte: frentista e moradora do subúrbio do Rio de Janeiro, Selminha (Schmütz) foi escolhida por seu tio para herdar toda sua fortuna de 300 milhões de reais. Mas, antes de colocar a mão nessa grana, precisa enfrentar um desafio: gastar 30 milhões de reais em um mês sem acumular nada para ela e sem contar para ninguém. Para cumprir a missão, Selminha vai precisar da ajuda da melhor amiga Luane (Katiuscia Canoro), do contador Ulysses (Marcus Majella) e da advogada Marilene (Fabiana Karla). Em 30 dias, ela vai se envolver em muitas confusões e perceber que ser rico pode não ser tão simples quanto parece.
Selminha (Schmütz) após o "momento Pretty Woman",
fazendo a "Selfinha da Selminha"
OK. Apesar da interessante premissa, uma coisa é texto, outra é atuação. E comédia tem um ponto que, se falhar, derruba qualquer texto. Chama-se "timing". E isso "Tô Ryca!" tem de sobra. O entrosamento do elenco é notório, principalmente no trio Schmütz-Majella-Karla. Sabe aquela comédia popularesca, que faz a plateia rir por diversas vezes seguidas, por não dar tempo de pensar no absurdo que vem pela frente? Esse é o tipo de filme que dá vontade de levar os amigos e amigas para assistir e cutucar, dizendo "Ih, esse personagem parece alguém que eu conheço!" - e receber a resposta "É, parece com você!". Pois é...

Schmütz faz uma comédia sem vergonha de ser comédia, sem vergonha do exagero, sem vergonha de fazer rir. Verdadeira herdeira do peculiar escracho de Dercy Gonçalves, das inúmeras faces de Chico Anysio - ela faz o próprio tio falecido, que, visualmente, lembra um pouco Richard Pryor (LEGAL ISSO, hein!) -, da malandragem de Os Trapalhões... Não se envergonha nem de sua própria diminuta altura e faz piada até com isso. Fala o que muitos se intimidariam em pensar, age histrionicamente como se não houvesse amanhã. Enche a tela. E não é que funciona?
O tio de Selminha
(a própria Schmütz!)
Mas o que chama a atenção mesmo é a construção do roteiro de Fil Braz. A atualização dessa história, mostrando todos os parênteses que divide nossa estranha sociedade carioca, desvendando que quem mora no Rio de Janeiro não é tão cordial quanto se é divulgado e, mesmo assim, soar engraçado mas reflexivo ao mesmo tempo é coisa de gênio. Sem exageros, cada situação é milimetricamente calculada para que se ria mas, em seguida, pare para pensar que poderia ser melhor se certas atitudes fossem tomadas.

Mesmo a tal cena da "Batalha do Passinho"
, que seria, a princípio, uma arriscada escolha, mostrou-se muito acertada, mostrando uma integração entre ricaços e periferia. E acaba por resumir toda a situação de luta de classes enfatizada pelo roteiro.

Destaque também para um dos últimos trabalhos da saudosa atriz Marília Pêra. É em apenas uma cena, digna de sua majestade. É a antiga geração passando o bastão à nova geração. Bonito.

Outro destaque bem interessante vai para versão "marota" de "Pretty Woman" - clássico 'one hit wonder' de Roy Orbison recriado de um jeito bem brasileiro. Porque tinha de ter essa música, né? E a cena é bem bolada. Tem também uma famosa canção do Queen e faz o maior sentido quando avaliamos a letra - que deveria estar legendada no filme.

"Mas não tem nada que te desagradou nesse filme? É bom pra caramba? Merece o Oscar?", pode perguntar o incauto poltronauta. Bem, tem umas coisinhas que desagradam, sim. A maior delas é justamente a dura atuação de Marcelo Adnet. Sabemos claramente os dois políticos em que seu personagem é baseado. Mas o jeito que Adnet fez isso é tão "bruto" - por falta de palavra melhor - que não dá chance de brincar com o ridículo. Não conversa. Talvez não tenha sido à toa o tapa que deu em Schmütz. Ele devia estar tão concentrado que acabou exagerando. Infelizmente, ele não alcançou todas as possibilidades do personagem. Pena.
O candidato (Marcelo Adnet) momento antes
de dar um tapa em Selminha (Schmütz)
E o terceiro ato da história também incomoda um pouco por conta da parte dramática. O fato da protagonista parecer não se importar pois está concorrendo numa campanha política e só se dar conta disso ao final foi um ponto negativo. Mas, por mais estranho que pareça, não compromete a diversão.

A direção de Pedro Antônio também é bem conduzida, sem querer reinventar a roda. A edição também ajudou nesse sentido. Tudo o que vemos em cena não está parecendo um monte de esquetes criados individualmente mas que não funcionam lado a lado.

Samantha Schmütz passa com louvor no teste, esbanjando carisma, reverenciando antigos baluartes mas mostrando que também entende do assunto. Ela e seus companheiros fazem "humor que funciona" - e, pior, mostraram como se faz bem feito. Dificilmente surgirá um filme mais engraçado que "Tô Ryca!" em 2016. Como dizem por aí: ganhou de lavada. Que bom!



Kal J. Moon votará em Selminha SOS para Prefeita do RJ!