Dirigido por Joe Wright e estrelado por Gary Oldman, "O Destino de Uma Nação" mostra muitas facetas de Winston Churchill num dos momentos mais cruciais à Inglaterra durante a Segunda Grande Guerra.


A (re)construção de um mito
Quando você assistir o trailer de "O Destino de Uma Nação" e ler a frase "Gary Oldman é Winston Churchill", não precisa acreditar. Até porque dificilmente muitos de nós, meros mortais, tivemos acesso a quaisquer vídeos com a presença desse militar - exceto aquelas pessoas muito interessadas em História mundial ou com real interesse sobre as guerras passadas - para podermos verificar as semelhanças ou diferenças entre a composição do ator e o estadista britânico. Mas uma coisa é certa: Oldman entrega uma atuação extraordinária, crível, multifacetada - e até simpática e bem humorada -de uma personagem que passa por um verdadeiro ardil para desacreditá-lo e destituí-lo por conta de erros pregressos - não à toa, acabou de ganhar o Globo de Ouro de Melhor Ator por seu trabalho nesse filme.

A trama retrata um dos mais turbulentos momentos da História. Ao ver as Forças Nazistas percorrendo toda a Europa Ocidental, uma ameaça de invasão eminente a uma população despreparada, um rei cético e um partido que conspira contra seu líder, Churchill (Oldman) está dividido entre negociar um tratado de paz com a Alemanha Nazista e firmar a luta pelos ideais em prol da liberdade de uma nação.

Quanto aos aspectos técnicos, o filme está muito bem servido. A começar pela prestigiosa e criativa direção de fotografia Bruno Delbonnel (de "O Fabuloso Destino de Amelie Poulain"), que ora trabalha planos e panorâmicas de forma angulosa, circular ou cromática; ora com grandes closes, mostrando parte do olhar das personagens - e quase, se pudesse, seus pensamentos!; ora fazendo uso de câmera lenta e clipping para enfatizar dois momentos distintos de tempo mas intimamente ligados; ora acompanhando Churchill visto de cima, ora em silhuetas. É um filme bonito de ver nesse sentido - repare na iluminação em todas as cenas em que o Rei George VI (Ben Mendelsohn) aparece, enfatizando sua dúvida em relação à nomeação de Churchill como Primeiro Ministro até sua confiança final, vindo finalmente a um cenário mais claro e iluminado.

O figurino desenvolvido por Jacqueline Durran (do recente "A Bela e a Fera") também é inspirado, embora não traga nada marcante visualmente falando. A trilha sonora original composta por Dario Marianelli - ganhador do Oscar por seu trabalho em "Desejo e Reparação", também dirigido por Wright - evoca toda a tensão relativa à contagem regressiva imposta pela trama.

Porém, o roteiro escrito por Anthony McCarten (indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado por “A Teoria de Tudo”) é burocrático, formulaico, com diversos momentos de licença poética em que é difícil de acreditar se o que é mostrado em cena realmente aconteceu - e se aconteceu, foi mesmo daquele jeito? Numa determinada cena, vemos Churchill explicando didaticamente a sua datilógrafa pessoal (Lily James) como pretende executar um melindroso plano de retirada de soldados do porto de Dunkirk. Essa extensa fala tem a função de explicar ao espectador, representado na persona daquela datilógrafa - é uma prática bem comum, chamada de "exposição". Nada errado com isso. Mas Churchill tinha de explicar isso justamente a uma datilógrafa sem a menor importância na trama? Ele tinha de convencer diversas pessoas de postos superiores e resolve explicar o que iria fazer justamente para quem não tinha peso dramático nessa história?!

E também temos de falar de diversos momentos telegrafados, tornando a trama nada sutil ao anunciar algumas "surpresas" da história logo adiante. Uma delas tem a ver com a "cena do metrô", mostrando Churchill como "homem do povo", herói improvável, pintando-o como homem que venceu através da palavra - denotado pela grande quantidade de monólogos interpretados por Oldman com maestria mas ilógicos em diversos trechos, onde ele tinha de ler um discurso que não daria tempo de tê-lo decorado. Tanto que nenhum outro membro do elenco se destaca positivamente, mesmo que se esforcem, como Kristin Scott Thomas - que interpreta Clemmie, esposa de Churchill - e Stephen Dillane - que interpreta o Visconde Halifax, desafeto de Churchill que o quer fora do cargo.

A direção de Wright prestigia o visual, menos que o embate verbal dos atores. No filme, é como se Churchill fosse uma explosão solar que, pouco a pouco, fosse consumindo seus adversários políticos, através da verborragia - mesmo que contando com muita sorte no decorrer dos dias. Wright fez pelo menos uma péssima escolha ao usar muitas cenas geradas por computador para compor um visual próximo de videogame em momentos onde a sutileza deveria imperar - mas acertou ao iniciar com imagens em branco e preto, além de colocar uma legenda gigante na tela com a contagem regressiva, simulando os populares "jornais de guerra", noticiários exibidos nos cinemas da época para informar a população sobre o que estava acontecendo nos campos de batalha.

No entanto, "O Destino de Uma Nação" está longe de ser um filme inassistível - mesmo com muitas incongruências no roteiro, ainda desperta curiosidade para saber o que realmente aconteceu neste evento histórico. Vale pela caracterização e atuação de Gary Oldman, além da tensão criada pelo senso de urgência do roteiro.




Kal J. Moon saiu do cinema e foi assistir "Dunkirk", dirigido por Christopher Nolan. Óbvio.