Galhofa gourmet
Não há nada de errado em filmes que se utilizam do característico humor popularesco. Por muito tempo e até mesmo nos dias de hoje fazem parte do tripé que sustenta o que insistimos em chamar de indústria cinematográfica nesta terra que tão pouco valoriza a arte - ou pelo menos não como deveria. Desde que o grupo Os Trapalhões - talvez a principal referência a ser notada aqui - chegou com suas aventuras nas telonas de todo o Brasil, várias tentativas foram feitas para alcançar as altas bilheterias do cultuado quarteto, algumas com êxito e outras nem tanto, ou bem longe disso. E "Cabras da Peste" bate na trave por um lado e acerta em cheio por outro ponto de vista.
Na trama, Trindade (Nachtergaele) e Bruceuilis (Filho), dois policiais de distritos e estados diferentes se deparam com uma trama envolvendo bandidos perigosos e o sequestro de uma cabra, com ligação ao tráfico de drogas e tudo. Ambos resolvem deixar as diferenças de estilo de trabalho de lado para resolver o que pode ser o maior caso de suas carreiras.
A ideia, bem clara, é fazer uma espécie de paródia - ou seria um remake? - de "Um Tira da Pesada" (com Eddie Murphy) e "A Hora do Rush" (com Jackie Chan e Chris Tucker), misturando a velha fórmula de pancadaria e bom humor com uma trama de investigação para amarrar as pontas no final. Um bom e velho buddy cop movie. Mais uma vez, nada de errado. O problema não é a ideia, mas talvez diversos fatores que comprometem seriamente parte do resultado esperado.
Mesmo que cheio de boas intenções - Edmilson Filho veste uma jaqueta muito parecida à de Eddie Murphy no primeiro filme da saga "Um Tira da Pesada", além da trilha sonora - composta por Gustavo Garbato, Guilherme Garbato e Rodrigo Scarcello - emular toda a trilha incidental deste filme (e incluir "Calor do Cão" - uma GENIAL versão brasileira de "The Heat Is On", na voz de Gaby Amarantos com participação do músico Júnior Bass Groovador - numa cena de perseguição), além de ótimas cenas de luta, muito bem coreografadas -, o filme tem sérios problemas de timing em muitas cenas onde o texto funcionaria com um pouco de direção de atores e uma edição mais esperta. As cenas de humor mais físico funcionam bem pois pegam o espectador de surpresa mas a grande maioria das piadas parecem telegrafadas de tão óbvias.
A verdade é que provavelmente a culpa não seja do ator mas sim do roteiro pouco inspirado que lhe entregaram. A trama construída por Brandt e Nielsen favorece Edmilson Filho em diversas cenas mas não faz o mesmo para Nachtergaele brilhar. Além do personagem ser mal construído - deveria ser muito mais afetado do que aparenta, uma vez que nunca esteve em trabalho de campo (um pouco de exagero cairia muito bem em algumas cenas). A galhofa não foi devidamente abraçada aqui.

Diversos outros nomes são sub-aproveitados como Rossicléia (assinando aqui como Valéria Vitoriano), Letícia Lima, Juliano Cazarré ou mesmo Leandro Ramos (mais conhecido pelo fenômeno humorístico "Choque de Cultura", aqui com uma maquiagem e lente de vidro mas que na prática não tem graça nenhuma)... Quem se deu bem foi justamente quem sabe se desvencilhar da quase figuração por conta própria como Victor Allen e Evelyn Castro. Já o cantor e ator Falcão (aqui assinando como Marcondes Falcão), completamente irreconhecível em cena, não extrai humor nem o perigo iminente pedido pelo roteiro.
Mas como "Cabras da Peste" foi lançado diretamente no streaming e não no cinema, a recepção tende a ser muito mais positiva para o público geral, aquele que só quer uma boa diversão escapista no fim de um dia cansativo de trabalho. Por esse ângulo, pode até funcionar. Mas poderia ser algo memorável na carreira de todos os envolvidos. Infelizmente, não é o caso. Mas era pra ser memorável? Fica a questão...