Indicado em três categorias no Oscar 2022 (incluindo Melhor Filme), escrito e dirigido por Paul Thomas Anderson, estrelado por Alana Haim, Cooper Hoffman e grande elenco (com participação especial de Sean Penn, Tom Waits e Bradley Cooper), "Licorice Pizza" transforma a idealização masculina em uma curiosa (e um tanto polêmica) história de amor nos gloriosos anos 1970.
Estar apaixonado quando não se é detentor do padrão de beleza estabelecido é uma das piores coisas que podem acontecer a qualquer ser humano. O "feio" - por falta de palavra melhor - tem de se provar a todo tempo para que conquiste a pessoa amada. Pode-se apelar para o bom humor, ou uma vestimenta que destaque suas outras qualidades físicas - o tal do "bonitinho" (que significa "feio arrumadinho") - e a boa e velha... lábia. E dá-lhe falatório para convencer o/a pretendente de que se é um "bom partido".
"Licorice Pizza" pega o velho chavão do cinema - rapaz conhece garota - e transforma numa interessante reconstituição de época, além de algo tão íntimo que muitas passagens provavelmente só serão devidamente entendidas no comentário do diretor em alguma mídia física.
Na trama, Gary - um jovem ator de pequenos papeis - está apaixonado por Alana - uma assistente de fotografia no colégio onde ele estuda. Enquanto tenta marcar um encontro com ela, surge o primeiro empecilho: a gritante diferença de idade (ela tem 25 anos de idade e ele, 15) - parece que alguém ouviu uma quilométrica canção de um certo trovador solitário... A curiosidade é que Gary não parece ter apenas 15, quase 16 anos de idade pois, além de corpulento e boa estatura, também já trabalha para se sustentar ao lado da mãe num escritório de relações pública, além de atuar de vez em quando ao lado de um elenco respeitável. É respeitável e um tanto charmoso para a idade - provavelmente deixou a timidez de lado por conta das artes cênicas. Enquanto que Alana, bem, ela não é exatamente o modelo de beleza estabelecido pela época em que se passa a história (1973, provavelmente) - nem hoje em dia, aliás: vinda de família de origem judaica, possui nariz adunco, seios nada volumosos e corpo esguio. Porém, como descrito acima, outras qualidades saltam aos olhos quando o espectador conhece melhor a personagem pois é bem humorada, apesar de um tanto nervosa.
Isso tudo aliado ao frescor da dupla de protagonistas - Alana Haim é guitarrista, tecladista e cantora na banda Haim ao lado das irmãs (que também aparecem no filme em seu núcleo familiar, ao lado de seus pais na vida real) e estreia no cinema ao lado de Gary Hoffman (que também nunca fez um filme mas é filho do saudoso Philip Seymour Hoffman). O diretor conseguiu com que ambos explodissem na tela com uma química admirável para estreantes - é aquela coisa: oportunidade não se desperdiça e esses dois fazem valer cada centavo do caro ingresso do cinema.
E mesmo sendo um rapaz esforçado, com espírito empreendedor, que procure se vestir bem, que trate Alana bem na maior parte do tempo, Gary é menor de idade. E como a maioria dos adolescentes, tenta provar que já é mais responsável do que sua idade e falta de experiência de vida permita provar o contrário. Difícil para Alana - que pode ser presa por dar uma chance a essa paixão, mesmo que na época isso não fosse lá muito bem conferido - que precisa se estabelecer por si só como mulher independente e pensar mais em "coisas de adulto" do que andar com um bando de adolescentes arrumando confusão, ainda que em em busca de dinheiro.
A direção de fotografia - comandada pelo próprio diretor ao lado de Michael Bauman - evoca com precisão um lado menos glamouroso mas ainda muito bonito dos alaranjados anos 1970. Aliado ao preciso figurino criado por Mark Bridges - que já trabalhou com o diretor e ganhou o Oscar por seu trabalho em "Trama Fantasma" - e o design de produção projetado por Florencia Martin fazem desse filme algo inusitado de se assistir em tempos de filmes tão vazios e sem substância.
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