Quinto filme da diretora Greta Gerwig, baseado na famosa boneca da Mattel, é irônico na medida certa


Achei engraçado acompanhar a histeria gerada pelo filme "Barbie", que mesmo antes de estrear já havia dividido o público em uma espécie de "guerra dos sexos" declarada entre "lacradoras" e "ressentidos". O burburinho começou no ano passado, quando foram divulgados as primeiras imagens e detalhes do filme, sendo agravado recentemente, após a exibição de teasers e trailers promocionais. 

Em grande medida, a informação de que o longa-metragem seria dirigido por Greta Gerwig, que escreveria o roteiro ao lado de seu parceiro Noah Baumbach, indicava de que a produção não seria um mero filme infantil. Gerwig e Baumbach são conhecidos por produções politicamente engajadas, como "Frances Ha" (2012) e "Mistress America" (2015). 

"Lady Bird: A Hora de Voar" (2017), primeiro filme totalmente escrito e dirigido por Gerwig foi indicado a cinco Oscars, incluindo Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Roteiro. Uma estreia e tanto em um projeto solo, para uma diretora que era mais conhecida, na época, no circuito independente.


Tais credenciais acenderam um alerta vermelho na tropa "anti-lacração", e muitos já se posicionavam contra "Barbie", antes mesmo do filme entrar em cartaz. Agora, após o lançamento e como esperado, o filme acabou se tornando uma daquelas produções que, por ignorância ou ingenuidade, "ou se ama, ou se odeia".

Alguns afirmam que o filme é uma obra que demoniza os homens, enquanto outros que é uma ode ao empoderamento feminino. Pra dizer a verdade, acredito que a dupla Gerwig / Baumbach tirou foi um grande sarro da cara de todo mundo. Da minha, da sua, da Mattel e, até mesmo, de si próprios. Sim, a dupla zoa a Mattel! Acha mesmo que eles não iam te zoar?

Acho necessário que surja em algum momento um filme que, de fato, eleve a autoestima das mulheres. Um filme POP, com alcance, que chegue ao público com uma linguagem de fácil assimilação e escancare a hipocrisia que gira em torno dos discursos políticos de empoderamento feminino, geralmente proferidos por homens em posição de poder que muito falam e pouco nomeiam mulheres para cargos importantes. Ocorre que, "Barbie" não é este filme, apesar de tudo que os ignorantes, ingênuos e hipócritas estejam gritando por aí.

O filme começa com uma homenagem ao filme "2001: Uma Odisseia no Espaço" (de Stanley Kubrick) e já basta para arrepiar os cabelos dos reacionários de plantão. Aliás, o filme traz muitas referências cinematográficas, sendo que nenhuma delas é gratuita, uma vez que complementam a trama e servem para explicar motivações, comportamentos e ações de personagens.

Após a "polêmica" introdução, somos jogados no mundo rosado da personagem título, interpretada por Margot Robbie (de "Esquadrão Suicida" e "Babilônia"). Gerwig brilha ao nos apresentar sua versão do mundo fictício da Barbie, utilizando recursos arrojados e criativos para mostrar um universo que só pode existir na imaginação das meninas que brincam com a boneca. Todos os detalhes de cenário são impecáveis e a iluminação e saturação das cenas são bem feitas, reproduzindo as brincadeiras infantis de modo belo. Um mundo feminino, afinal, foi criado, entre aspas, da imaginação de meninas do mundo todo.


Quando a trama se volta para o mundo real, Gerwig nos dá um tapa na cara, mostrando que a nossa realidade é moldada por homens, o que se traduz em um mundo extremamente masculino e cinzento. O contraste entre os mundo dos sonhos da Barbie e o nosso mundo cão, causa mudanças em Barbie e também em Ken, feito por Ryan Gosling (de La La Land e Driver).  A moça fica assustada, enquanto o rapaz fica desumbrado, e ambos começam a explorar este novo mundo, tentando entendê-lo. Cada um, a seu modo, acaba mudado e isto repercute no mundo cor-de-rosa de Barbie.

O roteiro teve a feliz ideia de usar a "Barbie estereotipada", mas comum, como personagem principal. Como ela nada mais é do que um "modelo de beleza", sem maiores especificações, vê-la enfrentar a crítica - e rejeição - das feministas foi muito divertido. O choque que ela leva ao ver a desconstrução de seu (antigo) slogan ("Tudo que Você Quer Ser!") contribui para a construção da personagem no filme.

Nas brincadeiras das meninas, elas são as personagens principais. Deste modo, Ken não passa de um coadjuvante no mundo da Barbie, nada mais que um interesse romântico da protagonista. Com o deslumbre, Ken deixa de ser um conformado e tristonho boneco acessório e decide montar seu próprio mundo dos sonhos. Encantado por ícones, atores e filmes POP, como cowboys montados em seus alazões, Sylvester Stallone (o garanhão italiano) e "O Poderoso Chefão" (filme no qual um personagem demonstra força decapitando um cavalo), Ken assume para si um símbolo poderoso: O cavalo. 

Além disso, ele passa a replicar comportamentos que jamais ocorreriam em um mundo "criado" pela mente de meninas, mas que seriam bem plausíveis em um universo imaginado por garotos. Mas Ken não é um brinquedo de meninos, e lendo nas entrelinhas, este fato torna tudo muito triste, apesar da graça da caricatura que é apresentada no filme. Caricatura esta que me fez "rir de mim mesmo", algumas vezes, durante o filme.

Apesar de não ser uma história muito original, "Barbie" tem recados debochados e irônicos que tornam o filme particularmente interessante. É um trabalho completo, muito divertido e que, se não for levado à sério, funciona demais.


O elenco é muito bom. Seu talento foi bastante exigido, uma vez que o filme tem números musicais e de dança, tudo muito bem executado. Se Margot Robbie tinha nascido para ser a Arlequina, personagem dos filmes do Esquadrão Suicida, da DC Comics, digo o mesmo de "Barbie". Robbie consegue nos convencer de que é uma boneca tornada gente, e este pode ser um dos trabalhos mais importantes de sua carreira. Fiquei feliz em vê-la atuando com ironia fina. Dá pra ver que ela está sendo sarcástica, irônica e debochada, porém, ela o faz de modo tão delicado que muito incauto não irá perceber esta faceta da personagem.

Ryan Gosling desfruta do mesmo talento para disfarçar a ironia, sendo ainda impressionante como ele evoluiu como ator. Ele brilha muito nos números musicais. Acho que ele vai conseguir beliscar uma indicação ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante.

Destaque também para a comediante Kate McKinnon, que interpreta uma personagem muito interessante, mas falar mais sobre isso seria dar spoilers, e isso eu não pretendo fazer. Barbie traz muitas participações especiais, como Issa Rae, Alexandra Shipp, Dua Lipa, Simu Liu, Kingsley Ben-Adir, John Cena, Michael Cera, Helen Mirren e Will Ferrell.

A trilha sonora é muito boa e foi composta pela dupla Mark Ronson e Andrew Wyatt. O filme traz ainda muitas canções POP famosas, algumas bastante óbvias como "Barbie Girl", do grupo Aqua e "Girls Just Wanna Have Fun", de Cindy Lauper.

Com duração bem curtinha, "Barbie" é um FILMAÇO! Fuja das tretas, tente assistir e procure se divertir.




Marlo George assistiu, escreveu e teve um Falcon alpinista com olhos de águia

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