Estrelado por Asa Butterfield, Ncuti Gatwa, Emma Mackey, Aimee-Lou Wood, Connor Swindells, Kedar Williams-Stirling, Mimi Keene, Gillian Anderson, George Robinson, Chinenye Ezeudu, Dua Saleh, Alistair Petrie, Samantha Spiro, Jim Howick, Rakhee Thakrar e grande elenco (mesmo!), a quarta temporada do cultuado seriado "Sex Education" chega a seu final de forma honesta e suave, apesar de todos os percalços para sua realização...
Um jovem, usando de um breve lampejo de sapiência e inspiração, disse-me certa feita que "seriados deveriam ter apenas, no máximo, cinco temporadas. Principalmente os de comédia". Quando indaguei o motivo da sentença, ele completa que "as ideias iniciais se esvaem e não há mais a graça da novidade". Independente desta sentença estar correta ou não, talvez o gás de "Sex Education" tenha saído da garrafa, tal qual um refrigerante "choco", restando apenas parte do dulçor, mas sem provocar a devida refrescância e a agradável espontaneidade de um arroto.
A última temporada do seriado é multi-temática, porém o roteiro - escrito a quatorze mãos por Troy Hunter, Krishna Istha, Selina Lim, Ethan Harvey, Annalisa Dinnella, Bella Heesom e Thara Popoola - atira a esmo, com uma trama (aparentemente) central mas com diversos sub-plots que, ou não são tão interessantes assim ou são completamente descartáveis. Com isso, há diversas cenas onde um excepcional e numeroso elenco parece entender que não há o que fazer além de se despedir de suas personagens da forma mais digna que puder, uma vez que não tem como adiar o inevitável final dessa jornada.
Mesmo que, desde a primeira temporada, o seriado levantasse diversas "bandeiras" - ou "agendas", se preferir -, aqui temos o máximo de "discursos" igualitários vindos das mais diversas minorias sociais. Talvez a mais importante (e emocionante) de todas venha justamente do co-protagonista que roubou a cena em cada capítulo que apareceu desde o início: Eric (magistralmente interpretado por Ncuti Gatwa) e sua saga para se reconciliar com sua fé judaico-cristã, tendo em vista que é homossexual assumido - exceto entre as paredes da igreja que sua família congrega.
Outra subtrama que pode se tirar algum proveito é o drama de Aimee (interpretada por Aimee-Lou Wood, outro destaque do elenco), que sofreu um abuso na primeira temporada e parou de usar roupas apertadas por receio de ocorrer novamente. Finalizar a jornada da personagem fazendo com que ela descubra a arte como forma de expressão e protesto é, ao mesmo tempo, mostrar que é possível superar um trauma como também explicar, didaticamente, o papel social das manifestações artísticas. Repare na cena onde a personagem diz umas verdades a trabalhadores urbanos sobre sorrir sem ter vontade e perceberá o quanto ela evoluiu...
Curiosamente, os dramas de Otis & Maeve (Asa Butterfield e Emma Mackey, respectivamente) com suas dificuldades num namoro à distância parecem interessantes no papel mas a realização faltou algum nível de profundidade que somente quando os personagens se separam é que se alcança algo realmente digno de nota, como os momentos de Maeve durante um enterro ou quando ela confronta um professor no auge da carreira com medo de concorrência (ou, ainda, quando tem de lidar com o irmão adicto).
O mesmo pode se dizer do casal trans Roman (Felix Mufti) & Abbi (Anthony Lexa), que, apesar de também possuírem potencial para criar debates, caem no supérfluo, com bem pouco a oferecer sobre as dificuldades de convivência num mundo que persegue constantemente minorias.
Pode-se atestar que, no geral, "Sex Education" nunca foi sobre sexo. Era TAMBÉM sobre sexo mas, principalmente, sobre relações interpessoais de afeto. E também sobre poder - ou, neste caso, sobre a perda do pátrio poder e o esforço de Michael (Alistair Petrie) para "se tornar alguém melhor" (em suas próprias palavras, repetidas à exaustão) depois de fazer terapia e insistir em conquistar a confiança do filho Adam (Connor Swindells) e da ex-esposa para reatar o casamento. Isso, obviamente, afeta suas investidas sexuais fora do casamento - mostrando que, se a cabeça do homem não vai bem, o corpo, literalmente, padece. Mesmo que uma bonita jornada de reconciliação e de real aprendizado, faltou um pouco de sintonia fina para emocionar (mesmo que houvesse momentos indicativos para tal).
E como não se irritar com a frouxidão com que é tratada o passado traumático de Ruby (Mimi Keene) - e que tem a ver com o passado de Sara O. -, trazendo um "ah, já me tratei e tá tudo bem", mesmo que a personagem demonstre uma necessidade de um círculo social para fazer parte... E não podemos nos esquecer dos desafios de Jean, mãe de Otis, tendo de lidar com sua bebê recém-nascida e o ato de voltar ao trabalho como radialista, além de ter de enfrentar parte do seu passado com sua irmã, que sofre de "síndrome do impostor" por conta de não conseguir lidar com um trauma de infância...
Todas essas subtramas poderiam ser melhor trabalhadas se houvesse tempo para tal. Mas o seriado precisava ter um final - que é meio que em aberto pois aquelas vidas continuam, cada pessoa seguindo seu caminho, assim como cada conhecido (a) com quem convivíamos na infância ou na adolescência e hoje em dia nem são amizade de rede social...
"Sex Education" pôs o debate na sala de estar, trazendo à baila assuntos considerados tabus em pleno século 21, falando a linguagem dos jovem atuais mas sem deixar de lado narrativas maduras. Apesar da quarta e última temporada ser praticamente um pot-pourri de tudo o que já vimos nas temporadas anteriores, ainda assim certamente figura entre as melhores "coming of age" de todos os tempos. Como diria um certo trovador solitário, "que se faça o sacrifício, que cresçam logo as crianças".
Kal J. Moon não bebe refrigerante e não sente falta (mentira!).
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