O mítico heroi criado por Edgar Rice Burroughs está de volta aos cinemas com o filme "A Lenda de Tarzan", dirigido por David Yates (saga Harry Potter) e com elenco estelar que inclui Alexander Skarsgård, Samuel L. Jackson, Margot Robbie, Djimon Hounsou, Jim Broadbent e, claro,Christoph Waltz.
Mas as novas audiências estão abertas a experimentar algo tão ~rústico em se tratando de entretenimento?
A reconstrução de um mito
Johnny Weissmuller. Burne Hogarth.Joe Kubert. Todos esses homens, de alguma forma, colaboraram para a construção do mito do personagem homem-macaco. Mas quando se pensa na essência de Tarzan, só uma palavra vem à mente: força.
Mesmo que o livro de Burroughs tivesse adultos como alvo, o personagem acertou em cheio a imaginação de crianças de várias gerações. Seu ápice deu-se entre as décadas de 1960 ao início da década de 1980.
Mesmo com todo o sucesso do passado, o lendário Tarzan ainda é, de longe, um dos mais complicados herois em matéria de adaptação para outras mídias. Fizeram muitos filmes, desenhos animados, histórias em quadrinhos... Porém, nunca se fugia de certas regras: bebê nasce na selva africana, é criado por macacos, enfrenta perigos mil, é encontrado, volta à civilização, recebe educação, retorna à selva.
Houve tentativas recentes até bem-sucedidas, gerando interesse por conta de desenhos animados (feitos para cinema e TV) mas nada que se mostrasse algo que devesse ser levado a serio. Tarzan ainda era um elemento ~"fantástico" de séculos passados, intocável, incólume... Algo para ser respeitado e revisitado de quando em vez. Mas Tarzan não era o veículo para tratar de temas relevantes, mesmo que se passasse muitos anos antes da civilização como conhecemos hoje. Até agora.
O diretor David Yates convocou toda a trupe que trabalhou com ele nos filmes da saga Harry Potter para trazer essa importância de volta ao personagem.
Para Yates, filmes baseados em livros tem de PARECER saídos das páginas de um livro. A narrativa, a interpretação, o ritmo, tudo tem de levar o espectador a ter uma experiência próxima da leitura. Essa é sua "assinatura" como diretor, goste-se ou não. O espectador SABE que um filme é dirigido por Yates só de assistir uma simples cena ao acaso.
E, talvez por conta desses fatores, "A Lenda de Tarzan" seja o filme de tom mais adulto com esses personagens desde "Greystoke". E isso é ótimo!
Nesta nova abordagem, passaram-se anos desde que o homem conhecido como Tarzan dos Macacos (Skarsgård) deixou as selvas da África para levar uma vida burguesa como John Clayton - ou Lorde Greystoke -, com sua amada esposa, Jane (Robbie) ao seu lado. Agora, ele é convidado a voltar ao Congo para servir como um adido comercial do Parlamento, sem saber que, na verdade, ele é uma peça usada em uma ação de ganância e vingança, organizada pelo belga Leon Rom (Waltz). Porém, as pessoas por trás dessa trama assassina não fazem ideia do que estão prestes a desencadear.
O filme respeita o espectador a ponto de mostrar pequenos trechos da origens de alguns personagens apenas como bússola para o que vem a seguir.
Temas importantes como escravidão, exploração mineral abusiva, desmatamento, assassinato de animais, ganância, choque cultural e muito mais são tratados com apuro de quem burila uma joia rara.
O filme mostra arquétipos de outrora mas que falam com plateias do mundo inteiro por conta de cada tema ser constantemente abordado em telejornais. "Nada de novo debaixo do sol", já dizia o bardo.
Mas a FORMA de se abordar tais temas agregam valor ao que é dito.
O novo elenco, apesar de esforçado, não desperta paixões. Waltz faz o papel de vilão de sempre porém mais apático do que nunca. Seus objetivos são bem claros e específicos e, talvez por isso, não é nenhuma surpresa quando toda sua artimanha é revelada. Já Skarsgård e Robbie até tem bom entrosamento em cena mas nada que mereça algum destaque. Skarsgård lembra MUITO as animações da Disney mas fornece pouco em termos de atuação. Convence mas não o suficiente.
O único ator que se destaca, apesar de pouco tempo em cena, é Djimon Hounsou. Cada minuto dele em tela é o bastante para crer em seu personagem e em sua curva dramática.
Os efeitos especiais, principalmente na movimento de Tarzan pelos cipós, mostram-se um tanto "falsos" mas nada que comprometa a diversão - sim, pois este é um filme divertido em vários aspectos, principalmente no que se refere à aventura em si.
Mas, curiosamente, é um filme que não empolga. Parece um eterno crescendo mas não chega ÀQUELA cena, costurando toda a trama.
Destaque também ao figurino hiper-realista criado por Ruth Myers (de "A Bússola de Ouro") e toda a cenografia criada por Anna Pinnock (ganhadora do Oscar por "O Grande Hotel Budapeste"), que conferem uma realidade para que o fantástico sobressaia. Provavelmente, haverá indicações ao Oscar nessas categorias.
A música composta por Rupert Gregson-Williams (de "Um Conto do Destino") também empolgam, nos momentos certos, com seus temas tribais e heroicos.
No fim das contas, "A Lenda de Tarzan" é um filme correto, ~"okay" no melhor sentido da palavra mas que, finalmente, conversa mais com os adultos do que ao restante do público.
É uma proposta arriscada? Sim. Mas não tinha como ser feito de outra forma sem macular o legado desse personagem. Até que enfim, diga-se de passagem...
Kal J. Moon deu o grito do Tarzan mas alguém chamou a ambulância pensando se tratar de um acidente...