Dirigido por Bill Condon e com um elenco estelar de nomes como Emma Watson, Ewan McGregor, Emma Thompson, Kevin Kline, Stanley Tucci, Sir Ian McKellen - dentre outros -, "A Bela e a Fera" - remake com atores do cultuado longa de animação da Walt Disney Pictures - finalmente estreia nos cinemas e fica a pergunta: é melhor do que o original? (Spoiler: É SIM!)
Bela (Emma Watson) e a Fera (Dan Stevens) naquele momento que
TODO MUNDO quer ver (Divulgação)
(des)Construindo um clássico
É realmente muito complicado falar de algo que muitos amam mas que você mesmo não acha assim tão bacana. Comigo ocorreu isso, uma vez que nunca fui muito fã da animação "A Bela e a Fera". "Mas as canções são muito boas!", "Foi uma das primeiras animações da Disney a utilizar computação gráfica...", "Primeira animação DA HISTÓRIA DO CINEMA a ganhar uma indicação ao Oscar de Melhor FIL-ME!", gritavam os fãs a minha pessoa, que, indiferente, resolveu reassistir para refrescar a memória.

E os problemas na estrutura da história original ainda estão lá, mesmo na péssima "Edição Especial" - que a Disney resolveu lançar restaurando o longa animado original dando um ar mais "brilhante" a uma trama propositadamente sombria. Bela era uma personagem um tanto sem graça - ainda que, do ponto de vista de um longa feito em 1991, seja bem afinada com as ideias de empoderamento feminino. A Fera era praticamente o protótipo de um "Christian Grey" da vida ("Não vá à ala leste!" = "Eu tenho hábitos estranhos"), com mandos e desmandos só por ter uma posição financeira e politicamente privilegiada.
Bela (Emma Watson): única personagem não-beneficiada pelo roteiro (Divulgação)

E foi com esse espírito de desânimo que fui assistir o live-action. E como fez bem à história passar por uma revisão após mais de 25 anos desde o lançamento da animação original. Tudo o que me irritava na primeira versão da Disney foi devidamente consertado no remake. Bela ainda é fascinada por leitura, é chamada de esquisita por conta disso, mas a biblioteca que ela visita não tem tantos livros assim e pertencem a alguém que, naquela vila, teria de se ocupar mesmo de ler - e não é um bibliotecário! Bela é filha de um relojoeiro - e não um inventor! -, deixando para ela o papel de mente criativa da família. A Fera tem seu castigo por conta do orgulho mas de forma bem diferente do original, porém ainda mostrando que ele era dominado pelo orgulho que sua posição social lhe concedia. E a relação entre o casal é muito melhor explicada do que qualquer Síndrome de Estocolmo que possa ter ocorrido no passado...

A trama original - moça humilde de pequena vila é mantida presa em castelo por horrenda fera após seu pai pegar uma rosa no jardim sem pedir permissão ao dono - foi mantida mas esses pequenos adendos - e alguns aprofundamentos na história - deixam tudo com um sabor novo nas telonas. E isso torna a história melhor de ser apreciada nesses difíceis novos tempos, onde parte do público deseja ver-se representado. E é com espanto que se vê a Walt Disney Pictures reconhecendo que esses são novos tempos, numa trama onde as coisas não são bem o que parecem ser. E outras estão bem escancaradas o que são.
Gaston (Luke Evans) e LeFou (Josh Gad):
humor em cena, driblando polêmicas (Divulgação)

"Mas e a polêmica do personagem homossexual?", pode alguém perguntar. Bem, quem já assistiu a animação original sabe que LeFou (no filme interpretado por Josh Gad) SEMPRE FOI homossexual e apaixonado por Gaston (defendido por Luke Evans, que parece estar no automático). A parte onde canta "em homenagem" aos feitos de Gaston nada mais era que uma declaração de amor. Na animação, pode até não ter sido declarado abertamente mas está lá para qualquer um ver. No filme, isso fica um pouco mais claro e não tem nada que já não tenha sido visto em novelas brasileiras. E, por conta de já estar no contexto original, foi bem executado, num tom farsesco e que revela boas partes da comédia em cena. Funcionou bem não porque ~"tem que ter" mas sim porque é parte intrínseca da história. Os tempos podem ser outros mas tudo deve ser bem utilizado em favor da trama.

(Curioso mesmo é ver que o filme tem TRÊS personagens homossexuais...)

Mesmo com todos estes predicados a favor, infelizmente, o filme não é perfeito. A começar por Emma Watson, que, após a saga "Harry Potter", teve uma carreira bem irregular no cinema, cujo maior destaque talvez seja "As Vantagens de Ser Invisível" - um filme que não é unanimidade entre crítica e público. Ela tinha sido chamada para estrelar o remake de "Cinderela" mas declinou pois não queria interpretar uma princesa. Aceitou o papel de Bela por conta de seu engajamento feminista na vida real e exigiu algumas mudanças para que a personagem conversasse melhor com o público atual. O problema é que, em cena, Bela não desempenha um papel tão importante assim. Se o roteiro escrito pela dupla Stephen Chbosky e Evan Spiliotopoulos se desse pela óptica dela - como no maravilhoso "Malévola" -, poderíamos ter algo muito melhor desenvolvido, mais aprofundado. Mas, assim como na animação, Bela depende da ação de homens para que a trama prossiga - mesmo que houvesse espaço suficiente para que isso ocorresse. E a atuação de Emma Watson deixa transparecer um certo cansaço em cena, como se fosse voto vencido. Talvez não tenha sido uma boa escolha, afinal. Mas todos tem que pagar o aluguel.

Aliás, nenhuma das atuações despertam grandes sentimentos. Quem chega mais próximo disso é Kevin Kline, que interpreta o pai de Bela. Porém, esperamos bem mais de um ganhador do Oscar de Melhor Ator.
Horloge (McKellen), Madame Samovar (Emma Thompson),
Lumière (Ewan McGregor) e Plumette (Gugu Mbatha-Raw): nada de novo mas ainda assim inédito
(Divulgação)
Por fim, uma das coisas que era mais queridas na animação acabou se perdendo por conta da tecnologia: o rosto da Fera. Estranhamente redesenhado para parecer mais humano - POR QUÊ? -, ficou com uma expressão só o filme inteiro - algo meio digno de Pierce Brosnan nos filmes do 007. Incomodou durante toda a exibição. Vale destacar também o já citado Josh Gad como LeFou e Sir Ian McKellen como Horloge - principalmente na parte final.

As qualidades técnicas saltam aos olhos, principalmente no que diz respeito a cenários, figurino e, claro, as músicas, devidamente entoadas da maneira correta para quem sabe de cor cada estrofe das belas canções de Alan Menken e cia. A direção de Bill Condon - já habitué dos musicais desde o ótimo "Dreamgirls" - conduziu muito bem cada cena, reproduzindo com exatidão alguns fotogramas da animação com atores beirando a perfeição.

Recomendado para fãs de carteirinha e para quem nunca achou lá grandes coisas, "A Bela e a Fera" é um verdadeiro divisor de águas em matéria de musical no cinema - mesmo que não reinvente a roda. Que bom!


Kal J. Moon não é fera mas é uma besta. (Não, péra...)