Nova produção da Netflix é a prova definitiva de que os gibis e desenhos animados japoneses devem continuar sendo protagonizados por atores riscados e não de carne e osso

A versão americana de Death Note, mangá publicado no Japão na década passada pela editora Shueisha, foi finalmente lançada pela Netflix e já está à disposição do público. Dirigido por Adam Wingard, Death Note decepciona pelos mesmos motivos que levaram o filme anterior do diretor, Bruxa de Blair, a fracassar: A tentativa de recontar uma história, atualizando-a, para funcionar para novas audiências. Esse erro foi apontado pelo nosso considerado Kal J. Moon, em sua crítica de Bruxa de Blair, e, pelo que parece, Wingard continua cometendo o mesmo erro.

Se daquela vez ele tentou trazer para os dias atuais o mockumentário dos anos 90, agora ele peca por "americanizar" uma história que só funciona quando ambientada em um ambiente asiático, afinal, as lendas nas quais a trama original se baseia, são japonesas. Portanto, se o protagonista, ou a história como um todo, tivesse origem japonesa, certamente seria mais consistente. E a palavra é essa mesmo, pois tudo em Death Note é inconsistente, uma vez que a trama é corrida, não permitindo a construção de personagens e, muito menos, das situações nas quais estão envolvidos. O roteiro é tão mal conduzido que chega a ser risível, quando deveria ser tenso, macabro, obscuro ou qualquer outro adjetivo que apontasse para um filme de terror.

Outro motivo de riso é a atuação de Nat Wolff, que interpreta o protagonista da história, Light. Não sei se sua escalação foi indicação do diretor ou fruto do lobby de algum agente, mas esse rapaz é inadequado para o papel. Não por ser ocidental, problema que poderia ser sanado pelo roteiro, se este fosse bem escrito, mas pelo fato dele não ter veia dramática. Cria de seriado infantil, Wolff chamou a atenção em A Culpa é das Estrelas, mas de lá pra cá vem apresentando péssimos trabalhos, como em Cidades de Papel e Um Senhor Estagiário. De promessa, está caminhado para se tornar decepção.


Como Wolff, Lakeith Stanfield, também tem uma performance aquém do que é esperado para um personagem importante como o que interpreta em Death Note, o misterioso "L". Caricato e exagerado ao extremo, Stanfield entrega um personagem absurdo e que não parece pertencer ao mesmo universo do filme em que está habitando. É muito fora de contexto e contribui ainda mais para a inconsistência da obra. Nos momentos em que o personagem está tenso, no terceiro ato, Stanfield interpreta tão mal o roteiro que eu não sabia se ria, chorava ou ficava constrangido por ele.

O interesse romântico de Light, Mia Sutton, ficou sob a responsabilidade de Margaret Qualley, uma atriz iniciante, com pouca bagagem e carisma. Lembra bastante a Anna Popplewell, de As Crônicas de Nárnia, e como essa, deve acabar caindo no ostracismo em breve.

Foi interessante assistir Shea Whigham tentando ser levado à sério em meio à tanta bobagem e decisões erradas da direção. É um bom ator, o único que se salva em um elenco tão ruim, além, é claro de Willem Dafoe, que ficou lá, sendo Willen Dafoe, e isso já é o suficiente. Amo tudo que ele faz e, apesar de tudo de ruim que esse filme tem, seu Ryuk ficou apavorante.

A produção de Death Note é caprichada, mas não há nenhum quesito que se destaca. A trilha sonora é ruim e a edição de som deixa um pouco à desejar.

Com tantos contras, Death Note é mais uma produção baseada em mangás e animes que não deu certo. Ao que parece, quando se tenta capturar o espírito dessas obras, para vertê-las para a telinha ou para a telona, algo se perde. Especialmente as versões estadunidenses. Isso aconteceu em diversas produções, de Dragon Ball Evolution, passando por Old Boy e, mais recentemente, A Vigilante do Amanhã: Ghost in the Shell. Esta última foi uma boa adaptação, mas nem de longe refletiu a obra original.


Marlo George assistiu, escreveu e já teve pesadelos com o live-action de Akira.