Dirigido por Cary Joji Fukunaga, estrelado por Daniel Craig, Léa Seydoux, Rami Malek, Lashana Lynch, Ralph Fiennes, Jeffrey Wright e grande elenco, "007 - Sem Tempo para Morrer" é o fatídico quinto e último filme da era Craig. E o que isso realmente quer dizer? Bem, vamos descobrir...


Ídolo de marfim, pés de barro
Imagens deslumbrantes, competentes cenas de ação, figurino marcante, sedução e romance na medida certa, locações em diversas partes do mundo, vilões com estranhas características físicas e um certo desequilíbrio psicológico, belas mulheres, agentes secretos que todos sabem o nome - e como se vestem, suas bebidas favoritas, mas, principalmente, como é seu rosto. Essas palavras descrevem qualquer filme da franquia 007 e aqui não é diferente. Porém, por se tratar do capítulo final - um epílogo, talvez? -, espera-se um pouco mais de esmero e dedicação dos envolvidos. E não foi exatamente o que encontramos em "007 - Sem Tempo para Morrer".

Na trama, após os acontecimentos de "007 contra Spectre", Bond (Craig) não faz mais parte do serviço de agente secreto, vive com Madeleine (Seydoux) viajando o mundo quando acaba sofrendo um atentado da organização terrorista Spectre na Itália (e que pode ou não ter envolvimento de sua amada). Após o ocorrido, Bond vive recluso, desfrutando de uma vida tranquila na Jamaica - o que não dura muito quando seu velho amigo Felix Leiter (Wright), da CIA, aparece pedindo ajuda numa missão para resgatar um cientista sequestrado acaba sendo muito mais traiçoeira do que o esperado, levando Bond à trilha de um misterioso vilão - que tem uma inesperada ligação com o passado de Madeleine e a Spectre - armado com uma nova e muito perigosa tecnologia.  


Este é, talvez, o filme mais irregular e indeciso desta pentalogia. Ainda que o roteiro de Neal Purvis, Robert Wade, Phoebe Waller-Bridge e do próprio Fukunaga busque uma coesão com os quatro filmes anteriores - não, você não precisa assistir a todos para entender este, mas ajuda para detectar uma ou outra menção a personagens e situações pregressas -, como se fosse mais uma adaptação de uma série de livros onde o protagonista percorre todo um arco de evolução para deparar-se com o fim da própria história, "007 - Sem Tempo para Morrer" oscila entre contar sua própria trama e reverenciar a própria franquia (não somente a estrelada por Craig e companhia como também a todos os vinte e tantos filmes anteriores). E a qualidade, aqui, parece pender para algo meramente diluído em vez de "batido e não mexido".

A começar pelas ideias da trama que tiveram de ser reestruturadas com a entrada de Waller-Bridge à turma do roteiro, provavelmente para incluir situações com mais humor - uma cena bem específica de Bond interrogando Blofeld (Waltz) parece ter sido pensada exatamente para arrancar risadas do público (Por quê? Sei lá!) - e mais representatividade e diversidade. Infelizmente, todas essas ideias vêm por água abaixo quando vemos que um importante personagem afrodescendente é o primeiro a morrer (então...), que Nomi (Lynch), a nova 007 (uma mulher afrodescendente, vale lembrar), é apenas uma agente muito boa no que faz, que exibe uma boa perícia em cenas de lutas bem coreografadas , mas sem personalidade marcante e sua importância na trama está atrelada apenas em ajudar o protagonista (pois é) e que vemos uma antítese de Bond girl personificada na irrelevante personagem de Ana de Armas (também não entendi) só para mostrar que existem agentes secretas novatas que participam de missões...


Isso sem contar no vilão mais equivocado de toda a franquia. Safin - interpretado pelo questionável ganhador do Oscar Rami Malek - tem um plano de aniquilação de seus inimigos digno da melhor fake news distribuída via Whatsapp por pessoas anti-vacina em tempos de pandemia. Dá uma conferida: ele se apropria de uma arma biológica que pode ser programada para matar apenas quem tiver o DNA selecionado pelo atacante pelo ar (em forma de gás) ou pelo toque de quem estiver infectado, pois nano-robôs invadem o sistema imunológico através desse contato. Safin tem um objetivo bem específico no começo da trama e depois muda para uma vingança não muito clara para terminar com aquela finalidade que qualquer vilão bondiano tem: matar James Bond (Por quê? Sei lá!).

Os aspectos técnicos são bem acima da média para os filmes da franquia, rivalizando, talvez, com "Operação Skyfall". A direção de fotografia comandada por Linus Sandgren (de "Trapaça" e "La La Land") traz a necessária energia cinética às cenas de ação mas também evoca a composição necessária em momentos de reflexão de alguns personagens. O figurino elaborado por Suttirat Anne Larlarb (da série "Deuses Americanos" e da vindoura "Obi-Wan Kenobi") interliga uma interessante conversa entre o clássico e o moderno. A direção de arte capitaneada por Mark Harris (de "007 - Operação Skyfall" e "007 contra Spectre") mantém a unidade com os filmes anteriores, unindo barroco e art déco com parcimônia em cenários, peças e maquinários. Em vários sentidos, "007 - Sem Tempo para Morrer" é um filme lindo de se ver.  Já a trilha sonora composta pelo veterano Hans Zimmer é correta e eficaz mas não tem nada de marcante.


"007 - Sem Tempo para Morrer" foi o primeiro filme a anunciar seu adiamento de lançamentos nos cinemas por conta da pandemia e também foi um dos poucos que a distribuidora se negou a lançar em streaming. Mas os problemas nos bastidores parecem ter sido maiores do que uma simples troca de datas pois quem dirigiria era o veterano Danny Boyle. Parte da equipe trazida por Boyle ficou no filme. A trilha sonora seria originalmente composta por Dan Romer (de "Beasts of No Nation", parceria com Fukunaga), que saiu por conta das tais "diferenças criativas". E só o fato de Waller-Bridge entrar para a equipe de roteiro com o filme rodando já significa que há pelo menos um prenúncio de retrabalho em algum nível, por menor que seja. E isso se reflete na tela grande - se pelo menos rendesse boas ideias e um roteiro melhor, mas nem isso... Provavelmente, este foi o filme da era Craig que teve mais interferência da equipe de produtores. Talvez para alcançar resultados de bilheteria e premiações próximos dos dois filmes anteriores ou talvez somente para satisfazer alguns egos e mostrar que quem manda é quem banca o projeto. Vai saber?

"007 - Sem Tempo para Morrer" é um filme "cansado". Um monte de situações preguiçosas de roteiro que apenas cumprem tabela em vez de encerrar epicamente uma saga tão cultuada. Só a decisão por aquele final ao protagonista - quando havia uma óbvia alternativa ao personagem - já emite o recado que foi dado há alguns anos: se Craig voltasse, seria para um último filme. Mesmo. Sem discussão ou finais abertos. O que acabou resultando num filme morno, o famoso "dá pra ver", mas não empolga como deveria. E com um vilão de objetivos próximos do risível. Pra fazer isso, por que se dar ao trabalho?

Como sempre dizemos, "a expectativa é a mãe da decepção". Baixe a sua, assista mas não espere muito e, talvez, possa se surpreender. Vale a ida ao cinema? Talvez, sim - tem lá seus momentos. Mas não será uma ida memorável. Pena.




Kal J. Moon está cansado de ver finais indignos de suas franquias favoritas. Que lástima...


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