O tsunami de cultura POP sul-coreana traz às praias do ocidente uma nova pérola: "Kill Boksoon". Mais uma obra do roteirista e diretor Sung-hyun Byun (do recente "Kingmaker"), é uma das novidades do gênero que vem crescendo cada vez mais em popularidade.

Kill Gil
Uma grande estrela no ramo dos assassinos de aluguel, a experiente Gil Bok-soon (Jeon Do-yeon, da série "Intensivão do Amor" e vencedora do prêmio de Melhor Atriz do Festival de Cannes pelo filme "Sol Secreto", 2007) se vê no dilema entre manter seu status profissional e sua dedicação à vida de mãe solteira de uma adolescente que também enfrenta os típicos conflitos da idade durante o ensino médio. Esta é a premissa da película com pouco mais de duas horas de duração, evocando a expectativa de um drama de ação que vai além de cenas de luta eletrizantemente bem coreografadas e se aprofunda na mente e na alma de seus protagonistas.

Entretanto, já é notório da sabedoria popular de que a danação eterna está repleta de boas intenções. Por isso, apesar de toda a boa execução, "Kil Boksoon" pode desanimar um pouco, principalmente pela quebra de ritmo entre as sequências de ação e as dramáticas. Essa estética de montagem vem se mostrando recorrente nas produções sul-coreanas, um padrão que parece não incomodar a numerosa audiência dessas obras, mas que pode parecer pouco atrativo para o público ocidental tradicional, tão acostumado com tramas frenéticas de tirar o fôlego.

Curiosamente, tanto os momentos de ação são irrepreensivelmente arrebatadores quanto os dramáticos são bem emotivos e reflexivos. Mérito do elenco composto principalmente pela já citada Jeon Do-yeon mas, também, por nomes como Sol Kyung-gu (de "Kingmaker"), Esom (da série "Mobeomtaeksi"), Si-ah Kim (da série "O Mar da Tranquilidade"), Lee Yeon (da minissérie "Duty After School"), Koo Kyo-hwan (da série "Uma Advogada Extraordinária") e Kim Sung-oh (da série "Desbloqueando o Chefe"), por suas atuações convincentes e cativantes, além da impressionante perícia nas sequências de luta.

Aliás, a esse outro ponto alto da trama devemos crédito à imaginação de Sung-hyun Byun numa harmoniosa conjunção orquestrada com a cinematografia de Hyung Rae Cho (de "O Impiedoso") e a ágil edição de Kim Sang-beom (de "Decisão de Partir"), que apresentam cenas com ângulos de câmera e enquadramentos inovadores e poucas vezes vistos em produções ocidentais do gênero.

Inclusive, alguns dirão que o filme lembra uma produção de Quentin Tarantino justamente pela estética dos segmentos de ação e a caracterização de alguns personagens. Há até quem possa dizer ser um "'Kill Bill' coreano", mas na verdade ele aparenta muito mais beber diretamente da mesma fonte: filmes chineses de ação. Além do mais, o próprio cinema coreano já concebeu suas próprias fontes de inspiração como o aclamado "Old Boy" (2003), que não apenas serviu de referência para a clichê cena da luta no corredor - reproduzida a exaustão em várias produções ocidentais - , como também ganhou uma versão hollywoodiana uma década depois.

Ainda há toda a carga dramática do arco da protagonista, trabalhando muito bem seus questionamentos em relação ao seu trabalho incomum e à sua relação com a filha adolescente. Suas reflexões e dilemas são tratados de forma autêntica e plausível, atraindo a simpatia do espectador, conduzindo bem a imersão, mesmo em sequências de cadência mais contida. Ainda que seja uma narrativa fantasiosa, a abordagem é muito mais crível, cuja condução e resolução dos conflitos entre mãe e filha são trabalhadas de forma muito melhor do que no oscarizado e badalado "Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo".

Um outro ponto forte do filme é justamente trazer mais uma vez o enfrentamento entre mãe e filha - como visto também em "Jung_E", por exemplo, que não apenas trata a questão do conflito de gerações, mas também apresenta o protagonismo de mulheres independentes de uma maneira muito mais competente do que várias tentativas apresentadas em produções ocidentais. Estas, por sua vez, geralmente soam panfletárias e inverossímeis, gerando mais rejeição do que a simpatia necessária ao reconhecimento de que toda mulher é tão capaz de qualquer coisa quanto qualquer homem. Já em "Kill Boksoon" também há espaço para a ousadia de falar sobre temas como a diversidade e a liberdade sexuais.

No fim das contas, "Kill Boksoon" é mais uma evidência da qualidade do cinema da terra do BTS (e do Psy), merecendo honestamente as primeiras colocações de filmes mais assistidos na plataforma paga de streaming Netflix. Mesmo que, em alguns momentos, possa parecer lento e arrastado, o conteúdo das sequências dramáticas tem alma o suficiente para manter o público interessado no desenrolar da trama. Além disso, se mostra mais um exemplar que prova que essas obras já conquistaram seu espaço deste lado de Greenwich.



Antonio Carlos Lemos se considera um "dorameiro honorário", já que na maior parte das vezes assiste às produções coreanas 
acompanhando sua esposa.


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