Dirigido por Jaume Collet-Serra, estrelado por Dwayne Johnson, Pierce Brosnan, Aldis Hodge, Noah Centineo, Quintessa Swindell e grande elenco, "Adão Negro" é o mais novo filme com personagens da DC Comics desde aquele embroglio chamado "O Esquadrão Suicida" (2021) - seguido pelo seriado "Pacificador" -, trazendo o Universo Cinematográfico da DC de volta a produtos mais simples e objetivos. Mas será que funciona?


Manual prático de anti-heroísmo pós moderno
"...e quando você vê que a crítica tá falando mal, você sabe, né? O filme vai ser fØd@...". Foi essa frase que este escriba ouviu pouco antes de iniciar a sessão num cinema de shopping com pouco mais de vinte pessoas para assistir "Adão Negro" no primeiro fim de semana de exibição. E é bem curioso essa relação de "quase-ódio" do público atual com o que se considera hoje como "formadores de opinião".

Sim, pois se você não sabe, poltronauta, a crítica de filmes e séries hoje em dia é feita não por jornalistas e pessoas formadas ou com conhecimento técnico em cinema mas, em sua grande maioria, de ~"influenciadores" digitais e uma imensa massa (e expressiva) de gente iletrada que nem sequer passou perto de um livro sobre teoria cinematográfica nem mesmo de uma faculdade ou curso técnico de cinema. E, por conta disso, sites agregadores de notas da crítica acaba reverberando o pensamento desse grupo e, por si só, não representa a classe como um todo. Daí, por si só, o comentário que abre esse parágrafo pode ser considerado correto pois "Adão Negro" pode ser muitas coisas mas está longe de ser classificado como um filme "ruim".


Na trama, quase 5000 anos após ser agraciado com os poderes onipotentes dos deuses egípcios e preso com a mesma rapidez, Adão Negro (Johnson) alcança a liberdade de sua tumba terrena, pronto para liberar sua justiça - ou vingança - no mundo moderno.

O personagem Teth-Adam foi criado pela dupla Otto Binder & C.C. Beck na primeira edição do gibi "The Marvel Family" em agosto de 1945 como um vilão bem bobinho para a família Shazam (Capitão Marvel e companhia). Com o passar dos anos e diversos reboots bem próprios dos quadrinhos depois, Adão Negro foi de versão maligna do Capitão Fraldinha a super-ditador de um país e, pasmem, integrante da Sociedade da Justiça. Mas levou pelo menos 15 anos desde a criação do projeto do filme até chegar às telonas. E muito disso por conta de todas as convicções do próprio Dwayne Johnson (que é fã do Superman desde a infância) para que isso ocorresse da forma "correta", tomando muito cuidado para retratar o personagem encarnando diversas versões dos próprios quadrinhos na telona bem coerente com o atual momento político global que estamos vivendo.


O roteiro escrito pelo trio Adam Sztykiel (de "Rampage - Destruição Total", também estrelado por Johnson), Rory Haines e Sohrab Noshirvani (ambos do recente "O Mauritano") é praticamente uma tese de conclusão de curso de faculdade sobre o que é o super-heroísmo e o que é o anti-heroísmo, do que se trata, como diferenciar ambas as posturas... Tudo bem didático para que audiências mais jovens entendam que Adão Negro não é um exemplo a se seguir pois ele mata pessoas para ajudar outras pessoas. Tudo muito bem explicadinho tintim por tintim na boca de personagens como Senhor Destino (Brosnan) e Gavião Negro (Hodge). Apesar da grande quantidade de exposição do roteiro, mesmo as tentativas de tentar adequar Adão Negro ao "modelo" de super-heroísmo que as atuais audiências estão acostumadas, o que vemos na tela é um nível de violência e destruição similar talvez ao que ocorreu em "O Homem de Aço" (2013), por exemplo. Segue bem a fórmula desse tipo de filme mas tem uma sustância ali, ainda que superficialmente...

E talvez as batalhas homéricas apresentadas em "Adão Negro" não sejam apenas uma coincidência - e também a principal crítica tanto nesse filme quanto em "O Homem de Aço" - pois vemos aqui toda uma direção de fotografia comandada por Lawrence Sher (de "Coringa") emula bem o que Amir MokriLarry Fong fizeram em "O Homem de Aço", "300" e "Batman Vs. Superman" - todos dirigidos por... Zack Snyder. Se não ficou claro, resumindo: "Adão Negro" é um filme do Zack Snyder - ou do universo snyderiano - dirigido por outra pessoa. E voltando ao parágrafo inicial desta análise, o povo enjoado e desprezível que faz parte do que é chamado de "crítica" hoje em dia abomina o que Snyder fez no cinema de super-heróis por pura birra, perseguição e conteúdo pago - sim, essa prática absurda advinda do "jabá" existe e ainda persiste, deturpando o objetivo original de quem procura trabalhar corretamente. Por isso mesmo, seguir a mesma cartilha visual e esquemática do que é feito num filme da lavra de Snyder não só causa repulsa como vai contra os princípios dessa gente cafona e desvairada.


Muita coisa apresentada em "Adão Negro" é feita com muito esmero. Desde o figurino criado pela dupla que assina como Kurt and Bart (de "A Vigilante do Amanhã" e "Deadpool 2"), até os cenários criados por Larry Dias (também de "Rampage"), passando pelo design de som projetado por Harry Cohen e sua equipe - não se espante se esses profissionais forem indicados às principais premiações de 2023. Porém, os efeitos especiais criados por Armani Barber (do vindouro "Shazam! Fúria dos Deuses") e sua trupe oscilam em qualidade: ora mostram imagens espetaculares, ora parecem "imagens de videogames" - mesmo assim, não é algo que estraga a experiência (olhos menos treinados nem vão perceber).

A direção de Jaume Collet-Serra (do recente "Jungle Cruise", também estrelado por Johnson) é segura e entrega algo bem funcional em matéria de filme de super-heróis: grandes cenas voltadas para o visual e bastante adrenalina. E não dá para deixar de lado a bela trilha sonora incidental composta por Lorne Balfe (do recente "Top Gun: Maverick"), trazendo de volta um grandioso tema heroico e trágico.


Já na parte de atuação, não tem o que falar de Dwayne Johnson pois ele não só nasceu para o papel de Adão Negro como defendeu, com unha, dentes e músculos, todas as decisões sobre o filme. Até mesmo aproximar o personagem do público infanto-juvenil dando boa parte da participação da trama em falas e ações de Amon (Bodhi Sabongui), um adolescente fã de quadrinhos da DC Comics e que serve como a exposição de heroísmo citada acima pois ele serve justamente para dizer o que é certo e o que é errado fazer, que frase de efeito é importante para um novo herói, esse tipo de coisa - que até chega a ser irritante a princípio mas depois lembra ao espectador mais velho que já agiu assim na infância e adolescência ao descobrir os super-seres da Distinta Concorrência. O mesmo pode ser dito de Adrianna (Sarah Shahi), arqueóloga responsável por libertar Adão Negro de sua prisão mística e também por mostrar aos membros da Sociedade da Justiça que o tipo de anti-heroísmo praticado por ele é justamente o que o povo de Khandaq - fictícia cidade do Oriente Médio - quer que seja feito pois nenhum super-herói ou super-heroína está lá para livrá-los da "milícia armamentista e tecnológica" chamada "Intergangue", que controla a cidade, incluindo quem entra e quem sai. E Karim (Mohammed Amer), irmão de Adrianna, é apenas um alívio cômico ambulante - pena pois o personagem tinha potencial...

Pierce Brosnan está simplesmente excelente como Kent Nelson / Senhor Destino - uma pena o que a trama lhe preserva (e, infelizmente, o roteiro não é nada sutil nesse sentido, uma vez que na primeira cena em que aparece, já se sabe qual será seu... destino). Aldis Hodge faz de seu Gavião Negro um brigão esquentadinho que se reporta de igual para igual com Amanda Waller (Viola Davis) - que tem apenas duas breves cenas mas uma será bem importante para o futuro do Universo Cinematográfico da DC. O mesmo não pode ser dito das participações de Ciclone (Quintessa Swindell) e Esmaga-Átomo (Noah Centineo), que são uma mistura de "nerd da cadeira" com alívio cômico, tiradas jocosas e até mesmo um próto-interesse romântico um do outro. Ambos não tem uma cena lá muito importante e apenas participam dos momentos de ação e drama como satélites em torno dos demais.

(ATENÇÃO: nos parágrafos abaixo, será tratado de momentos cruciais da trama e, por isso mesmo, repleto de spoilers. Caso ainda não tenha assistido o filme e não queira prejudicar sua experiência, pule direto para o parágrafo final dessa crítica. Mas, se quiser insistir para saber o que está escrito, basta selecionar com o mouse o espaço em branco abaixo)

Bem, a resolução da trama é o básico de toda história em quadrinhos onde super-heróis se encontram: lutam entre si para depois descobrir um inimigo em comum, unem forças e o derrotam, apertam as mãos e prometem se encontrar no futuro. Em "Adão Negro", infelizmente os trailers liberaram as imagens do tal "inimigo em comum" (PRA QUÊ?! ME DIZ: PRA QUÊ ISSO?!) e muitas pessoas não tiveram a surpresa que deveria acontecer na sala de cinema. Não diremos com qual personagem acontece mas a trama dá a entender com quem vai ocorrer uma das reviravoltas da trama nesse sentido - quando você assistir, vai entender logo no início da exibição.

Além disso, outra reviravolta da trama - essa bem explorada - traz à tona as reais intenções de Teth-Adam (que deveria ter sido traduzida pela legenda e pela dublagem como "Teth-Adão" pois não faz o menor sentido o personagem se chamar Adam e depois "Adão Negro", né?) e o que de fato ocorreu quando era um escravo. Essa parte poderia ter sido mais burilada pelos roteiristas mas, ainda assim, foi uma ótima surpresa pois o fã de carteirinha da DC Comics assiste dois terços do filme pensando que mudaram a origem inteira do personagem para perceber que a História não é contada por quem a viveu mas sim por quem venceu a guerra... E mostra, também, que o desejo de justiça com as próprias mãos parte de um ímpeto infantil que pode ser bem perigoso para quem estiver ao redor quando se pratica isso quando adulto. Ainda que de forma pueril e bem inocente, a trama toca em pontos bem atuais da política nesse sentido...

Também há a participação-surpresa da Agente Emilia Harcourt (Jennifer Holland) - personagem que apareceu em "O Esquadrão Suicida" e no seriado "Pacificador" - participação breve mas, ao que tudo indica, a Força Tarefa-X (parte tática do comando estratégico de Amanda Waller) está agindo nos bastidores super-heroísticos como sempre.

E claro que não se pode deixar de falar do segundo segredo mais mal guardado do cinema: sim, Henry Cavill FINALMENTE está de volta como Superman. É apenas na cena pós-créditos, com a já citada participação de Amanda Waller (Viola Davis) - que parece ter sido a escolhida como o equivalente feminino de Nick Fury, só que do Universo Cinematográfico da DC - mas que é praticamente um pedido de desculpas aos fãs que desejavam ver o ator novamente como o Homem de Aço. E, prepare-se: o corte de cabelo, com direito a "pega-rapaz" e tudo, só o deixou cada vez mais parecido com o saudoso Christopher Reeve (1952-2004) - ainda o Superman definitivo do cinema. A homenagem fica ainda mais explícita com (de novo, FINALMENTE) a inserção de um trecho da icônica trilha sonora composta por John Williams.


(FIM DO ALERTA DE SPOILERS)

"Adão Negro" pode não ser o filme perfeito com super-seres da DC Comics que todo mundo queria assistir mas certamente é uma boa sessão de cinema, repleta de ação e adrenalina. E não, a ~"crítica" não gostou do filme porque ele "não tem lacração" - personagens de diversas etnias contracenando pelo bem da história é o que geralmente se reclamar ser "lacração", certo? - mas sim por desconhecer o material original pois essa gente enjoada e de nariz em pé nem chega perto dos quadrinhos, diferente de gente mais aprazível como eu e você. "Adão Negro" vale, sim, o valor do caro ingresso e certamente ouviremos falar mais desses personagens no futuro.




Kal J. Moon saiu do cinema e gritou: 'VI ADÃO NEGRO!!!'. O povo ao redor o olhou meio torto...


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